Patrícia da Graça Oliveira é natural da cidade de Albufeira, local que assume ser “belíssimo, com as praias mais bonitas da Europa”. Aos 38 anos de idade, vive hoje na Suíça, em Lausanne. Diz-se realizada pessoal e profissionalmente.
Em entrevista à nossa reportagem, Patrícia, que atua na área da saúde, falou sobre o dia a dia no país helvético e sobre os planos para o futuro.
Em que locais de Portugal tem família?
Os meus pais vivem no concelho de Albufeira e a minha avó de 100 anos vive no concelho de Tomar com a minha tia.
Como é a sua vida na Suíça?
A minha vida na Suíça é simples, tentando sempre aproveitar ao máximo o que o país pode oferecer. Quero com isto dizer que no Inverno faço atividades de Inverno, como, por exemplo, Ski e raquetes, de verão entre as piscinas no lago Léman e caminhadas na montanha.
Como é viver na Suíça?
Viver na Suíça é como viver em Portugal, mas com um sentimento menor de injustiça social.
Em que trabalha na Suíça?
Eu trabalho há 11 anos no Serviço de Urgência do CHUV (Centre Hospitalier Universitaire Vaudois) como enfermeira em Lausanne. Neste serviço, pude fazer a especialidade de enfermeira da urgência. É um serviço multidisciplinar que pode receber utentes com uma simples infeção urinaria bem como utentes com traumatismos graves.
Convive com a comunidade portuguesa na Suíça?
Sim, os meus melhores amigos são portugueses e tenho colegas portugueses no meu serviço. Partilhamos bastantes momentos juntos como jantares, por exemplo. Agora menos, por causa das restrições ligadas à COVID. Até temos um grupo do WhatsApp com o nome “Tugas da Urgência”.
Como os portugueses são recebidos no país?
Daquilo que conheço, são bem recebidos. Quando comecei a trabalhar no Serviço de Urgência tinha só 8 meses de prática em francês porque o meu primeiro país de emigração foi a França. No serviço de urgência, tive algumas dificuldades relativas à língua francesa e à adaptação a um serviço multiespecializado. A dificuldade estava ligada a isso e não ao facto de ser portuguesa. O CHUV é um hospital que tem 107 nacionalidades com 11.900 colaboradores e estão habituados a colaboradores de diferentes nacionalidades.
Frequenta associações portuguesas?
Ainda não.
Como consegue matar as saudades de Portugal?
Saudade…. aquela palavra bem portuguesa. Mato as saudades quando falo em português com os meus amigos e a minha família, quando oiço Tiago Bettencourt, Ana Moura, Ornatos Violeta ou Márcia, quando eu via os Lives de “Como é que o bicho Mexe” do Bruno Nogueira, quando vejo vídeos do Herman José, quando eu leio livros em português ou o jornal o “Público”, quando faço as receitas da Clara de Sousa, quando vejo o “Maluco Beleza”…. isto tudo me faz sentir em Portugal e portuguesa.
Vive com a sua família?
“Os amigos são a família que escolhemos”. Esta frase parece simples e muito dita, mas, de facto, é isso mesmo. Vivo próxima dos meus amigos que partilham comigo muitos momentos importantes da minha vida e me ajudam a tomar muitas decisões importantes. E eles são essenciais. Muito obrigada a eles por estarem presentes.
Qual é o sentimento quando regressa a Portugal de férias?
O sentimento é esse mesmo…Férias. Trabalhei durante dois anos e meio em Portugal e, vivendo em Albufeira, não aproveitava as magníficas praias e o magnífico tempo de Portugal porque trabalhava em dois hospitais a tempo inteiro. Quando volto a Portugal tenho a sensação de aproveitar o que o país oferece. As “minhas” praias, o “meu” sol. Assim como tenho a sensação de aproveitar “melhor” a minha família. Ou talvez seja só a consciência da importância disso.
Pensa em voltar a viver em Portugal algum dia?
É difícil responder a essa pergunta. A vida pode-nos reservar tantas surpresas. A médio prazo diria que não.
O que conquistou na Suíça até agora?
A minha maior conquista foi a minha independência financeira. Sempre tive o desejo de conhecer o Mundo, viajar, conhecer outras culturas e estar perto com outras formas de viver e ver a vida. A Suíça permitiu-me isso. Já presenciei o sol da meia-noite na Islândia, sobrevoei o Grand Canyon nos Estados Unidos da América em helicóptero, acampei no deserto da Mauritânia, dormi à luz das estrelas no deserto da Etiópia, dei um mergulho numa piscina natural no deserto do Danakil e mergulhei na praia Sirena em Cayo Largo, Cuba, por exemplo. Fiz cursos de fotografia em Paris, Londres e Nova Iorque. Em Nova Iorque, vivi um mês onde consolidei conhecimentos sobre a fotografia e faço alguns trabalhos como fotógrafa. Foi esta liberdade que conquistei na Suíça.
Tem filhos?
Não.
O que a Suíça significa para si?
A Suíça tem um significado muito importante para mim. Foi o país que realizou os meus sonhos. A nível profissional, o sonho de ser enfermeira especialista da urgência, de ter um emprego onde tivesse progressão na carreira, por exemplo, sou aumentada todos os anos e sou paga como especialista. A nível pessoal, pude conhecer o mundo. A situação da pandemia e como enfermeira da urgência trouxe-me um novo sentimento em relação ao país. Dei muito de mim própria ao país, pus a minha própria vida em risco e estou na frente da “batalha” contra o vírus e, por esta razão, pedi a naturalização.
Que imagem tem de Portugal?
A imagem que tenho de Portugal é que os portugueses são uns lutadores e que trabalham muito duro. Costumo dizer que tenho o “síndrome de Sócrates”, porque o que me levou a sair de Portugal em 2008 foi a situação político-económica de Portugal. Na altura, apercebi-me da injustiça social presente no país, que, para mim, ainda hoje está presente. Saí de Portugal com um grande sentimento de injustiça. Por exemplo, trabalhei sem contrato num serviço publico e nenhuma possibilidade de evolução na carreira. Quando alguém começa a trabalhar com estas condições e para ter alguma liberdade financeira precisa trabalhar em dois hospitais é muito desmotivador. Hoje, a imagem que tenho de Portugal é que o “bom” do país muitas vezes quem aproveita não são a maioria dos portugueses.
Onde vive?
Vivo numa cidade chamada Lausanne, no Cantão de Vaud. É uma cidade com 145.000 habitantes. Tenho a sorte de viver a cinco minutos do trabalho a pé. É uma cidade universitária. Tem como cenário o lago Léman.
Como e por que foi viver nesse país?
A vinda para a Suíça foi uma questão de oportunidade profissional. Quando emigrei pela primeira vez, foi através de uma empresa de recrutamento espanhola que recrutava para a França. Como o meu nível de francês era muito básico não consegui trabalhar no serviço de urgência. Fiquei descontente e como não me sentia em segurança na cidade onde trabalhava no sul da França, e através de uma empresa de recrutamento suíça, consegui um trabalho numa urgência central num hospital que falava francês, que foi sempre o que desejei. Simples assim.
O que espera do futuro?
Neste momento só espero que a pandemia acabe rápido para podermos voltar a estar uns com os outros, sem restrições, com muitos abraços, beijos e calor humano. Já agora, aproveito este momento para desejar um Feliz 2022 para os meus amigos e a minha família.
Qual a diferença de vida entre Portugal e a Suíça?
É difícil responder a essa pergunta, mas acho que a maior diferença é não ter a minha família perto de mim e não partilhar mais momentos em conjunto.
A língua é um problema?
Esta é uma pergunta interessante em relação à Suíça. Digo isto porque é um país que tem 4 línguas oficiais. Eu vivo num cantão onde a língua oficial é o francês. Graças à COVID, aproveitei as minhas férias para conhecer certas regiões da Suíça, como o Ticino, os Grisões ou St Gallen. Por exemplo, nos Grisões é o alemão e o “Romanche” as línguas oficiais. Poucas pessoas falam francês então pensei que teria alguma dificuldade, mais falei mais em português que numa língua oficial suíça. Quando visitei o Ticino falei em português e em inglês. E a Suíça é isto, multilinguística.
Como a pandemia impactou o seu dia a dia e o da sua família?
Como enfermeira, continuei a trabalhar, por isso, os confinamentos foram mais fáceis de passar porque pude estar com os meus colegas e não estive fechada em casa. Mas, no início da pandemia, tenho que admitir que era muito preocupante ir trabalhar porque não se conhecia o vírus e as suas consequências. Havia muita incerteza. Evitei ao máximo estar com os meus amigos e família, que foi triste. Neste momento, faço teste antigénico para estar com pessoas e evito viajar.
Por fim, como vive o coração do imigrante português na Suíça?
O coração vive sereno com a decisão de viver na Suíça, mas cheio de saudades de dar um mergulho no mar.
Ígor Lopes