António Manuel Neves Ferrão. Dito desta forma a maioria terá dificuldade em reconhecer de quem se trata. É um nome de um português, normal, uma pessoa, como ele diz, simples, com defeitos e virtudes, talvez com um dom que não sabe explicar e que não o preocupa por aí além. Partilha esse dom como melhor o sente, no meio e para o seu público, as pessoas, como ele.
Falamos de Toy, um furacão de popularidade, uma “pessoa”, como não se cansa de repetir. Alguém que fez da sua vida uma ode ao amor e à alegria de poder ser ele, sem filtros ou máscaras. Diria que a não há quem lhe fique indiferente, e não é questão de “ódio ou amor”, afinal o homem tem um dom que é transversal a gerações, géneros musicais, diversidade somente ao alcance de pessoas, como ele. Esteve em Genebra, num espectáculo em Thonex, promovido por Norberto Ferreira e estivemos à conversa.
Toy, ou António Ferrão, grato por teres concedido este teu tempo, tu, uma das pessoas mais queridas do povo português.
Meu Deus! Um exagero! Sou somente um de vós, de nós.
Natural do distrito de Setúbal, região de grandes vultos, novamente na Suíça.
Já não sei quantas vezes, mas é sempre um enorme prazer estar convosco.
Toy, longa carreira, começaste cedo, aos 5 anos.
Sim, o meu era músico amador num grupo e eu e minha irmã, gostávamos de cantar com eles. Um dia decidiram contrataram-nos para fazer um mini espetáculo em Setúbal. Atuámos, cantei, toquei bateria, e mais tarde entrei para um grupo de teatro amador que tinha música e uma pequena orquestra, onde nasceu o bichinho do palco que nunca mais saiu.
Antigamente eram as coletividades que asseguravam a vertente cultural dos nossos tempos, anos 70 para diante.
Abençoadas coletividades que tanto deram, e continuam a dar, às populações com a sua generosa oferta cultural. É onde se começa no teatro, música, desporto, etc., desenvolvendo jovens que sem elas seriam, talvez, mais vulneráveis a outras coisas, e quando digo outras coisas é perigos vários.
Tens uma característica especial. És consensual para todos os públicos. Como dizes, és uma pessoa, como todos.
Somos pessoas. Sou um mortal. Adoro que as pessoas gostem de mim, evidentemente, sou versátil por ser curioso, canto tudo e toco tudo, música ligeira, ópera, fado, rock, etc. Nunca tive complexos de cantar músicas simples, não vivemos só de camarão tigre, também vivemos do tremoço, há espaço para tudo e para todos, a minha missão é chegar ao fim da linha e dizer que fiz pessoas felizes porque eu era, sou, uma pessoa feliz, e fazer os outros felizes é extraordinário. Eu penso que nascemos com a finalidade de fazer algo de positivo na vida para que os nossos se orgulhem de nós e para quando partirmos estarmos de consciência tranquila por ter praticado o bem. Seja na música, espetáculo, carpintaria, obras, não importa, todos somos importantes, somos pessoas, o universo escolheu-me para estar na música e entretenimento. Eu sou apologista que a sociedade deveria dar a oportunidade para cada um seguir as suas vocações e não as obrigar a seguir caminhos porque os pais querem ou porque é moda, bem visto socialmente, de relevo financeiramente, onde te dizem que terás um futuro melhor, mas que afinal produzem gente infeliz. A sociedade será melhor se cada um fazer aquilo que gosta, fazendo o que mais se gosta serve-se melhor a sociedade.
Essa paixão em ser nós próprios, em tentarmos ser genuínos, lembra que mais tarde ou mais cedo a vida se encarrega de nos presentear, compensar, de uma maneira ou de outra. O exemplo é de um amigo teu, o Cândido Costa, que por ter viajado nas nuvens e ter voltado à terra, nunca deixou de ser quem é e encontrou o caminho para ser feliz principalmente fazendo os outros felizes.
É um ótimo exemplo. O Cândido é um grande amigo e exemplo de que a vida não se esgota quando termina um ciclo. Se agora ficasse sem voz, teria outros meios de explanar as minhas competências. Eu escrevo música, escrevo, faço arranjos, escrevo para muita gente, já escrevi mais de 3 mil canções. Mesmo que houvesse um apagão, enquanto tiver dois braços e duas pernas haverá sempre trabalho para fazer, sempre maneira de ajudar a sociedade. A minha maior riqueza é a saúde, a segunda são os amigos. A amizade não se esgota porque é a única fortuna que mesmo depois de morto ninguém consegue gastar. Um homem rico pode deixar herdeiros que podem gastar a fortuna rapidamente, a amizade não se consegue delapidar.
Pai, filho, avô, com períodos difíceis na tua vida, o amor foi a tua tábua de suporte, a história de amor dos teus pais é inspiração.
Sim, a história de amor dos meus pais serviu-me, entre outras coisas, de mote para o que me orientou e orienta na vida. O meu pai era um homem casado quando conheceu a minha mãe e com uma certa diferença de idade, a minha mãe fugiu de casa para ir viver com um homem casado. Para aquele tempo era complicado. O meu pai era alfaiate, um artista, e a história de amor deles teve um começo difícil e um final feliz, como as mais belas histórias de amor. No meio de tudo isto, pensando nós que a “lei” da vida nos levaria primeiro o meu pai, foi a minha mãe que partiu aos 60 anos e o meu pai aos 95, o que nos diz que nem sempre a idade é o documento certo para o epílogo da vida. O amor é o verdadeiro combustível da vida. Devemos assumir que somos frágeis, chorar e sorrir, neste amor que é a vida.
A tua versatilidade é conhecida e, quando esperávamos que estivesse quase esgotado, eis que surges no Taskmaster.
Que aventura. Ali sou o Toy, louco saudável. Normalmente querem ver o Toy a cantar, a representar, a imitar, o músico, mas antes de tudo sou uma pessoa, e naquele programa sou eu! Simplesmente eu. Dizem-me, sobe a uma árvore, e eu subo, mergulha na piscina… e ali sou o Toy lá de casa. Adoro.
Há pouco tempo assistimos a um programa na RTP 2 onde se explica as particularidades da dita música pimba.
A cultura é muito vasta. Aconselho todos os jovens a ler como se bebe copos de àgua, não se esquecendo de ler todas as partes, branco e preto. Hoje deturpam-se notícias e precisamos de ter o discernimento necessário, conhecer factos históricos que nos ajudam a compreender a evolução dos tempos, filtrar tudo o que o dito liberalismo moderno nos quer impor para, então, podermos emitir opinião e até aconselhar os mais novos. O que hoje se apresenta obedece a uma linha de instrumentalização ideológica que castra o maior dos bens do ser humano, o livre arbítrio. Estejamos atentos porque é nosso dever alertar para estes perigos. Leiam, muito.
Enquanto pai, avô, o mundo atual assusta-te?
Sim, muito. Hoje assiste-se a mortes em direto todos os dias, crianças, velhos, novos, mulheres, vide o caso da Palestina, história mal contada, sem que se tente parar este massacre. Resumindo é dizer que enquanto os fornecedores de armas quiserem, isto irá continuar. Numa guerra injusta, há países que ajudam e participam num genocídio, mas que se auguram como polícias do mundo. Os países que são cúmplices são os mesmo que fornecem as armas para o que está a acontecer e neste inclui-se toda e qualquer raça ou crença.
Há pessoas boas e más em todos os povos e crenças, mas assusta-me que se corte a liberdade com justificações enviesadas e duvidosas. Há uma dificuldade de pensamento e penso que se estivermos do lado do amor conseguimos ser mais justos e estaremos do lado certo.
Tens hoje o teu espetáculo
e como é de bom-tom,
desejo-te um “balde de merda” para logo à noite.
Agradeço e se não sabes vou explicar qual a origem desse dito. A história remonta ao séc. XVIII, em França, e diz-se “parte uma perna” ou o já referido “balde de merda”, porque naquele tempo as pessoas iam para o teatro de cavalo, em coches, e os artistas quando chegavam ao teatro e viam muitos excrementos de cavalo, sabiam que o teatro estava cheio. Até podiam escorregar e partir uma, portanto é essa a origem da história.
Estamos em fim de uma conversa que poderia demorar dias, mas queria que deixasses uma mensagem aos nossos compatriotas, tu que foste igualmente emigrante na Alemanha durante 8 anos.
Dizer que o meu coração viveu o sofrimento por não estar no meu país. Podemos estar bem financeiramente, mas nada se compara à nossa casa. É o preencher de alma que nos falta sempre, estejamos onde estivermos. A vida de emigrante é passar a vida fora de casa. Chegar a casa é inexplicável, já que não podem estar a casa, trazemo-la através da nossa música popular, das nossas palavras de carinho, ternura e o nosso abraço. Os emigrantes precisam de um abraço e de uma defesa em Portugal. Tenho muito orgulho em defender os emigrantes e da importância em os receber condignamente, fazê-los sentir em casa. Não podemos fazer sentir aos emigrantes que não têm casa, a vossa casa é a nossa, de todos. Viva os emigrantes e um grande abraço de gratidão.
› Ilídio Morgado