“O turismo consiste na principal exportação portuguesa para a Suíça, tendo totalizado mais de 800 milhões de euros em 2023”. É desta forma que João Rui Ferreira, atual Secretário de Estado da Economia de Portugal, explica parte da evolução das relações económicas entre Portugal e Suíça nos últimos anos.
Este governante, licenciado em Engenharia Química, com pós-graduação em Métodos Quantitativos em Gestão e com experiência em Programa avançado de Gestão, avança que, na relação bilateral entre Portugal e a Suíça, no âmbito das exportações, “os serviços” figuram como principal componente, com destaque para as viagens e o turismo, seguidos das telecomunicações e informática ou os serviços financeiros.
Antigo Secretário-geral da APCOR – Associação Portuguesa da Cortiça e presidente da Confederação Europeia da Cortiça, o Secretário de Estado da Economia acredita que “a não perceção do potencial de inovação, qualificação dos recursos humanos e soluções ambientalmente sustentáveis” são os principais obstáculos que Portugal deve ultrapassar para operar no mercado helvético.
Para compreender as dinâmicas comerciais e económicas entre Portugal e Suíça, conversamos com João Rui Ferreira, que sublinhou que “a comunidade portuguesa nesse país continua a ser a terceira maior a nível do continente europeu” e defendeu que “as remessas representam uma importante fonte de rendimento para as famílias”.
Como têm evoluído as relações económicas entre Portugal e Suíça nos últimos anos?
As relações económicas com a Suíça revestem-se de dinamismo e relevância para Portugal. A Suíça foi, em 2023, o 11.º cliente das exportações portuguesas de bens e serviços e o 18º fornecedor das importações, tendo sido ainda o 7.º investidor estrangeiro em Portugal. Por outro lado, o número de empresas exportadoras nacionais para o mercado suíço também aumentou nos últimos anos, o que revela um interesse crescente das nossas empresas por este mercado. As exportações de serviços são a principal componente e representaram mais de 74% do valor total das exportações de bens e serviços e, neste âmbito, o turismo consiste na principal exportação portuguesa para a Suíça, tendo totalizado mais de 800 milhões de euros em 2023. Entre os principais produtos exportados para a Suíça em 2023, destacam-se os Produtos Químicos, os Produtos Agroalimentares, Máquinas e Aparelhos, Têxteis e Vestuário, Material de Transporte e os Minérios e Metais. Já as importações centraram-se nos Produtos Químicos e nas Máquinas e Aparelhos. Quanto ao investimento bilateral, a Suíça conta historicamente com uma presença não só comercial, mas também industrial e de centros de competências de relativa relevância em Portugal. Sendo que a presença de empresas suíças em Portugal verifica-se em setores estratégicos para o país, designadamente nas energias renováveis, farmacêutico, alimentar, relojoaria e o luxo em geral, vestuário, bens de equipamento, materiais de construção e, recentemente, a aviação e aeroespacial, e ainda nos serviços (TIC, seguros e setor financeiro, correios, telecomunicações). Já o investimento português na Suíça, outrora residual e resumindo-se a serviços financeiros com escritórios de representação dos principais bancos portugueses, evoluiu para o apoio a operações comerciais, o setor IT e assim como empresas com atividades de elevado valor acrescentado nas áreas da arquitetura e da saúde.
Qual o impacto da comunidade portuguesa emigrada na Suíça na economia portuguesa, tanto ao nível do envio de remessas como através de investimentos diretos em Portugal?
Embora a entrada de cidadãos portugueses na Suíça esteja em queda desde 2017, a comunidade portuguesa nesse país continua a ser a terceira maior a nível do continente europeu e a representar o terceiro maior grupo de cidadãos estrangeiros radicados no país (cerca de 260 mil), sendo responsável por mais de um quarto do total de remessas recebidas por Portugal.
Que oportunidades existem para as empresas portuguesas expandirem os seus negócios na Suíça?
Como setores de oportunidade para as nossas empresas em termos de comércio e investimento bilateral, destacam-se além dos setores ditos mais tradicionais, a existência de oportunidades de negócio em setores tecnológicos, como o aeronáutico, financeiro, arquitetura e construção, tecnologias de informação e comunicação, indústrias de luxo, saúde, energias renováveis, mas também no agroalimentar e metalomecânica, entre outros.
Quais os principais setores da economia portuguesa que têm beneficiado das relações comerciais com a Suíça e quais os desafios que as empresas portuguesas enfrentam ao operar no mercado helvético?
Ao longo dos últimos anos, o relacionamento comercial e económico entre a Suíça e Portugal tem revelado dinamismo e ganho uma crescente relevância. E, como já foi referido, são os serviços que se têm afirmado como a principal componente de exportação do relacionamento bilateral entre Portugal e a Suíça, destacando-se neste âmbito as viagens e o turismo, seguidos de outros como as telecomunicações e informática ou ainda os serviços financeiros. Quanto aos maiores desafios que as empresas portuguesas enfrentam ao operar no mercado suíço, um deles tem a ver com os elevados direitos aduaneiros que recaem sobre alguns produtos não industriais e outro com os entraves que se verificam às exportações europeias, nomeadamente ao nível da rotulagem, das quotas de importação, das elevadas taxas alfandegárias, do registo necessário para processamento de IVA e da nomeação de representante fiscal na Suíça no caso de faturação total de remessas. Porém, talvez o principal obstáculo seja ainda a não perceção do potencial de inovação, qualificação dos recursos humanos e soluções ambientalmente sustentáveis que Portugal apresenta. Por outro lado, existe também uma preferência clara pelos produtos locais face aos que vêm de fora, o que é um aspeto positivo. Mas talvez o caminho seja a penetração de investimento e produtos/materiais/tecnologias portuguesas nas cadeias de valor suíças, o que permitirá não desvirtuar a origem final do produto, que será sempre local.
Que medidas tem o governo português adotado para atrair investidores de países como a Suíça, e que setores específicos têm sido apontados como de maior interesse para estes investidores?
No caso da Suíça as autoridades portuguesas têm realizado várias visitas ao país com o objetivo de atrair investimento em Portugal. A par das visitas oficiais, a AICEP tem mantido campanhas de angariação de investimento ao longo de todo o ano, sendo que em 2023 estas tiveram particular enfoque nos setores ferroviário e aeronáutico/aeroespacial. Em paralelo têm decorrido campanhas de imagem de setor casa e moda assim como a promoção de mostras e degustações do setor vitivinícola, realizadas por parceiros. E a AICEP tem ainda procedido à identificação de parceiros e de fóruns no setor da digitalização, com particular destaque para a primeira presença de Portugal com pavilhão institucional da AICEP na ‘Swiss Cybersecurity Days’, que se realizou em Berna em fevereiro de 2024.
Existem incentivos específicos ou programas de apoio para portugueses emigrados que pretendam regressar ao país e investir em Portugal? Se sim, que áreas mais interessam a Portugal?
Sim, o Governo tem estado a trabalhar na medida 10 do Programa ‘Acelerar a Economia’: Novo regime de atração de talento (IFICI+). Esta medida tem como objetivo a atração de talento qualificado para a economia nacional e visa incentivar o regresso e a fixação de emigrantes altamente qualificados em Portugal. A mesma consiste num incentivo fiscal à investigação científica, inovação e capital humano, por forma a abranger um conjunto alargado de profissões qualificadas e empresas. Será aplicada uma taxa de 20% sobre os rendimentos do trabalho (categorias A e B) o que potenciará o crescimento das empresas portuguesas e a captação de talento. Antes de ser promulgada, a mesma terá ainda de ser aprovada na Assembleia da República.
Como pode explicar à emigração portuguesa o atual cenário económico português? Quais os desafios e oportunidades? É seguro investir em Portugal? De que forma incentivam este movimento?
Portugal tem vindo a crescer de forma consistente e tem conseguido resistir com resiliência ao enquadramento externo incerto. Para 2024, o Governo prevê um crescimento de 2% do PIB e a expetativa é a de que no próximo ano este ritmo possa ser mantido. A verificar-se, Portugal continuará a crescer acima da média da zona euro. A conjuntura internacional, e os movimentos de nearshoring e friendshoring que resultaram da pandemia de covid-19, abrem um conjunto de oportunidades muito relevantes para a economia portuguesa. Portugal é um país seguro, com recursos humanos qualificados, empresas competitivas, e um forte grau de abertura ao exterior – o que o torna um país atrativo para fazer negócio, conforme demonstra o EY Atractiveness survey, onde o país ocupa a 7ª posição. O Governo tem vindo a adotar medidas para reforçar este perfil internacionalizado da economia portuguesa – em especial através do Programa Acelerar a Economia. Este programa elenca 60 medidas fiscais e económicas através das quais se procura reforçar a escala das empresas, a capitalização e o acesso ao financiamento, o empreendedorismo, a inovação, o talento, a sustentabilidade e a clusterização. Existem vários níveis de apoio e de acolhimento aos projetos de investimento em Portugal. Vale a pena destacar o recém-criado sistema de incentivos a “Investimentos em Setores Estratégicos”, que já mereceu o aval da Comissão Europeia, e que conta com uma dotação de 1.000 milhões de euros.
Que atratividade vê o governo português no mercado suíço?
A Suíça é um país com um elevadíssimo nível de desenvolvimento, com serviços financeiros muito desenvolvidos e uma indústria de alta tecnologia e inovadora. Somando estas características ao facto de ter um poder de compra elevado, é sem dúvida um mercado atrativo. Na Suíça coexistem, por um lado, sedes globais de grandes grupos multinacionais, tirando partido de vantagens construídas de neutralidade, centralidade, fiscalidade e baixo custo de capital e, por outro lado, sólidas empresas suíças com competências firmadas nos setores da saúde, financeiro, defesa/aeronáutica, ferrovia, nutrição, materiais de construção, tecnologias de informação, mecânica de precisão, artigos de luxo.
Dados recentes do Banco de Portugal mostram que as remessas dos emigrantes subiram 1,01% no primeiro semestre, para 1.989,14 milhões de euros, ao passo que as verbas enviadas pelos estrangeiros em Portugal aumentaram quase 5%, para 298,38 milhões de euros. De que forma este movimento financeiro pode auxiliar no crescimento da economia portuguesa?
As remessas representam uma importante fonte de rendimento para as famílias, potenciando o crescimento e o desenvolvimento das economias e mantendo laços com os respetivos países de origem. No caso de Portugal, os dados mostram que os emigrantes portugueses enviam regularmente remessas para as suas famílias, mantendo uma forte ligação com o país. As remessas de emigrantes têm uma forte influência na economia portuguesa, sendo superiores às remessas de imigrantes.
› Ígor Lopes