Em entrevista à nossa reportagem, Paulo Maia e Silva falou sobre as dificuldades impostas pela pandemia à rotina dos serviços consulares, destacou que Portugal é um destino turístico de eleição para os suíços, mencionou que os suíços têm escolhido Portugal para viver após a reforma, explicou o papel da comunidade portuguesa na aproximação entre os dois países nas últimas décadas.
Este diplomata comentou ainda que existem diversos portugueses que ocupam lugares importantes no mundo da banca e das finanças na Suíça, revelou que valoriza o trabalho das associações portuguesas, abordou a importância de estas entidades se candidataram ao Programa de Apoio ao Associativismo da Direção Geral dos Assuntos Consulares e das Comunidades Portuguesas e disse testemunhar a influência da língua portuguesa nesse país europeu.
A pandemia está a tornar o trabalho diplomático mais difícil?
O trabalho consular tem sido intenso e diversificado. Como é sabido, o problema que a pandemia colocou prende-se principalmente com a impossibilidade de as pessoas se concentrarem ou estarem reunidas, fundamentalmente em espaços fechados. Nesse contexto, intensificou-se algum atendimento consular à distância, o que é muito positivo. Ainda que uma boa parte dos atos consulares solicitados requeira a presença das pessoas interessadas, já é possível, há algum tempo, renovar o cartão de cidadão on-line, em certas e determinadas condições. Trata-se, assim, de uma modalidade que isenta a pessoa de se deslocar a um Consulado ou a uma Embaixada. Por outro lado, atos de registo civil muito habituais como os registos de casamento e de nascimento são, num primeiro tempo, processados por via eletrónica, sendo as certidões enviadas pelo correio. As pessoas terão de comparecer nos nossos serviços consulares, mas apenas uma vez. No domínio do notariado, os certificados são enviados pelo correio. A aposta consiste em desmaterializar, cada vez mais, os serviços prestados. Esse procedimento já permite a um número cada vez maior de utentes tratar de certos assuntos consulares sem terem de se deslocar aos Consulados ou às Embaixadas.
Como vê a Suíça?
A Suíça é um país maravilhoso para se viver e trabalhar. Por outro lado, acolheu bem as portuguesas e os portugueses, que decidiram iniciar uma nova vida. Como será certamente do seu conhecimento, Portugal também é um destino turístico de eleição para os suíços. Por outro lado, muitos suíços, quando se reformam, escolhem o nosso país. Existe uma proximidade entre Portugal e a Suíça, a qual tem sido reforçada, ao longo das últimas décadas, em grande parte graças à nossa comunidade.
Quantos portugueses vivem em Zurique?
No cantão de Zurique, vivem pouco menos de 28 mil pessoas. Trata-se da terceira maior comunidade estrangeira na cidade de Zurique. A nível nacional, como sabe, a comunidade portuguesa é a terceira mais importante, após as comunidades alemã e italiana.
Qual é a sua opinião sobre a comunidade lusodescendente no país?
Trata-se de uma comunidade dinâmica, esforçada e bem integrada, entre outras qualidades que a caracterizam. A comunidade portuguesa honra não só Portugal como também a própria Suíça.
Como estão os serviços consulares em Zurique neste momento? Que dificuldades precisam ser ultrapassadas? Que serviços estão interrompidos?
O Consulado Geral de Portugal em Zurique tem funcionado bem. Em estreita coordenação com o Senhor Embaixador de Portugal em Berna, procuramos servir da melhor maneira possível a comunidade portuguesa. Não existem serviços interrompidos. Por outro lado, à exceção dos meses de março e abril do ano passado, foi possível manter um bom ritmo de atendimento, apesar das dificuldades que a pandemia da Covid-19 criou. Devo referir que existe alguma dificuldade em atender todas as chamadas telefónicas, que recebemos diariamente em número significativo. É um facto. Assim sendo, temos sempre informado o nosso público utente de que é preferível enviar um e-mail a telefonar. Acresce que a informação disponibilizada na nossa página web (https://www.consuladogeralportugalzurique.ch/) permite esclarecer uma grande parte das dúvidas que nos são colocadas. Por outro lado, criámos uma página no Facebook em outubro do ano passado (https://www.facebook.com/Consulado-Geral-de-Portugal-em-Zurique-106442204568426).
O que pode ser feito para melhorar esse cenário? Está previsto o aumento do número de funcionários nesses serviços em Zurique?
É fundamental aproveitar toda e qualquer oportunidade, como esta, para transmitir à comunidade portuguesa que a utilização do correio eletrónico, ou seja, o envio de um e-mail, resolve muitas das solicitações, que nos são apresentadas. Há muitas questões, nomeadamente em matéria de registo civil, tais como nascimentos e casamentos, entre muitos outros atos consulares, que necessitam de informação escrita. Ora, a transmissão dessa informação pelo telefone não é viável, salvo casos específicos. A nossa página web é esclarecedora e é constantemente atualizada, também em função das sugestões dos nossos utentes. Por outro lado, existe há já algum tempo a possibilidade de a própria pessoa escolher o dia e a hora em que gostaria de ser atendida. Trata-se do sistema de agendamento on-line (https://www.consuladogeralportugalzurique.ch/agendamento-consular-online/). Por último, compreendemos que haja pessoas que não saibam utilizar a Internet com a facilidade desejada. Contudo, estamos em crer igualmente que todos nós conhecemos alguém que nos é próximo e que pode enviar um e-mail em nosso nome a fim de solicitar uma informação ou uma marcação, conforme o caso.
Como é a vida em Zurique?
A vida em Zurique é muito agradável. Existe uma qualidade de vida apreciável e a cidade é sossegada. Aliás, a palavra Zurique em alemão, “Zürich”, foi formada através da contração de um jogo de palavras, que espelha bem o quão agradável é viver em Zurique. O nome “Zürich” provém do seguinte jogo de palavras em alemão: “Zu ruhig” (demasiado sossegada) e “Zu reich” (demasiado rica).
Há neste momento restrições na deslocação de cidadãos entre a Suíça e Portugal? Se sim, quais são e que critérios existem?
Permanece a necessidade de apenas se realizarem deslocações essenciais a Portugal, dado que a pandemia ainda não foi erradicada. Essa é a razão pela qual toda e qualquer deslocação a Portugal, pelo menos até ao final do dia 16 de maio, obriga à realização de um teste RT-PCR negativo, efetuado, no máximo 72 horas antes da partida. A esse respeito, a Embaixada de Portugal e os Consulados em Genebra e em Zurique têm estado sempre atentos à atualização da informação nas respetivas páginas web, bem como nas redes sociais.
Como é vista e recebida a comunidade portuguesa em Zurique?
Trata-se de uma comunidade muito diversificada e dinâmica. Gostaria de salientar o facto de haver muitas Portuguesas e Portugueses que ocupam lugares importantes no mundo da banca e das finanças.
Na sua opinião, qual é a importância das casas regionais na manutenção da cultura portuguesa na Suíça? Frequenta associações portuguesas em Zurique? Se sim, quais?
De há um ano a esta parte, devido à pandemia, não tem havido, infelizmente, muita atividade da parte das associações. Compreende-se perfeitamente. Contudo, valorizo toda e qualquer associação portuguesa. Considero-as como “pedaços vivos” de Portugal. São espaços onde, para além de se falar português, se consomem muitos produtos portugueses e onde a cultura portuguesa é valorizada. Os Ranchos folclóricos, por exemplo, e as suas atividades, perpetuam tradições culturais portuguesas, que não devem ser esquecidas, principalmente junto das gerações mais novas. Será necessário esperar que os efeitos da pandemia passem. No entanto, uma vez mais, gostaria de fazer um apelo, no sentido de as associações poderem beneficiar do Programa de Apoio ao Associativismo da Direção Geral dos Assuntos Consulares e das Comunidades Portuguesas. Trata-se de um programa que apoia financeiramente ações que visam promover a língua, história, cultura e tradições portuguesas, bem como a integração das comunidades portuguesas da diáspora. Este programa pode cofinanciar até ao limite máximo de 80% da verba total do projeto, objeto de candidatura. A esse respeito, gostaria, uma vez mais, de convidar todas e todos os dirigentes associativos a consultarem os seguintes atalhos do Portal das Comunidades Portuguesas, dado que contêm informação importante: https://www.portaldascomunidades.mne.pt/pt/apoios/area-cultural-e-movimento-associativo e https://www.portaldascomunidades.mne.pt/pt/apoios/area-cultural-e-movimento-associativo/atribuicao-de-apoios-pela-dgaccp
Novamente, aproveito pa-ra convidar as associações a exporem-nos eventuais dúvidas acerca do processo de candidatura. Continuamos disponíveis para qualquer esclarecimento.
Quais são os desafios para a promoção da língua portuguesa na Suíça?
O Instituto Camões, através da Coordenação do Ensino do Português na Suíça, dispõe de uma rede importante de professoras e de professores de português. São pessoas muito esforçadas e que efetuam muitas deslocações na Suíça a fim de dar aulas ao maior número possível de jovens da nossa comunidade. A este respeito, e no quadro do Dia Mundial da Língua Portuguesa, que se celebrou no dia 5 de maio, a Coordenação do Ensino do Português na Suíça organizou, entre os dias 3 e 8 de maio, a Semana da Língua Portuguesa. O programa das comemorações, divulgado pela Embaixada de Portugal e pelos Consulados em Genebra e Zurique, contou com uma série de atividades e de escritores. Aproveito para informar que foi prolongado até ao dia 31 de maio o prazo para as inscrições dos Cursos de Língua e Cultura Portuguesas junto do Ensino do Português na Suíça (https://epesuica.ch/). Na Suíça, a língua portuguesa é falada por uma comunidade lusófona, que ultrapassa as 330 mil pessoas. Somos cerca de 263 mil portugueses, a que é necessário somar cerca de 70 mil brasileiros. Não posso deixar de referir que a última sala da ala sobre a história da Suíça, inaugurada em 2019, no Museu Nacional Suíço de Zurique, refere que a língua portuguesa é falada por 3,41% da população suíça. É uma percentagem importante no quadro das línguas mais faladas na Suíça. Aproveito esta oportunidade para incentivar, uma vez mais, as famílias a falarem português em casa. É importante aprender a língua do cantão onde se vive e trabalha, dado que é um passo fundamental no processo de integração. Contudo, também não devemos nunca esquecer que é um orgulho ser português e que a língua portuguesa é uma das mais faladas no mundo.
O que podem esperar do seu trabalho?
Antes de chegar à Suíça, já havia lido a entrevista que o Senhor Embaixador António Ricoca Freire concedeu à “Gazeta Lusófona” e à qual já me referi. Tenho procurado orientar a minha atuação, em função das palavras do Senhor Embaixador, segundo as quais “desejo ser um embaixador de proximidade e sempre presente junto da comunidade”. Podem esperar igualmente empenho e dedicação. Tenho procurado também ser inovador na forma como tento transmitir mensagens à Comunidade portuguesa. Nesse âmbito, tenho utilizado cada vez as redes sociais de forma a ir ao encontro das pessoas. Gostaria de salientar a dedicação e o empenho de todas as funcionárias e de todos os funcionários do Consulado em Zurique e do Escritório Consular em Lugano. São e têm sido excecionais. Os Conselheiros das Comunidades Portuguesas e os membros do Conselho Consultivo da Área Consular de Zurique também têm desempenhado um importante papel. Valorizo igualmente a dedicação e o espírito de entrega dos portugueses em geral e daqueles, que tanto têm ajudado o Consulado a atender o maior número possível de pessoas nas presenças consulares em Basileia, Klosters e Samedan.
Como está a situação do novo coronavírus em Zurique?
Permita-me que me preocupe não tanto com a situação da Covid-19 em Zurique, mas principalmente com a situação da comunidade portuguesa perante o processo de vacinação. Já é possível as pessoas inscreverem-se para se vacinar. Como é do domínio público, a vacina é gratuita. Ao nível do cantão de Zurique, a inscrição pode ser feita, mediante a consulta do seguinte link: https://zh.vacme.ch/start
Gostaria de dar a conhecer que o Município de Zurique, através do respetivo Departamento de Promoção da Integração (https://www.stadt-zuerich.ch/integration), disponibilizou informação em português referente ao processo de vacinação, através dos seguintes links:
e
ZH_Impfinformation_Covid-19_portugiesisch.pdf. Está igualmente disponível um vídeo no Youtube com legendas em português, acessível através deste atalho: https://www.youtube.com/watch?v=fMq-v6Z_kEw&t=1s
O Consulado tem recebido pedidos de ajuda por parte de portugueses em Zurique?
Em março e abril do ano passado, recebemos pedidos de ajuda para regressar a Portugal.
Que mensagem deixa para os luso-suíços que dependem da atuação das diferentes valências da diplomacia portuguesa nesse país europeu?
A entrevista que o Senhor Embaixador António Ricoca Freire concedeu à “Gazeta Lusófona”, no primeiro trimestre de 2018, pouco tempo após assumir as funções de Embaixador de Portugal em Berna, demonstra bem a importância que a diplomacia portuguesa atribui às comunidades portuguesas na Suíça, à promoção da língua portuguesa neste país, e, naturalmente, às relações entre Portugal e a Suíça. Concentrando-me nos aspetos de natureza consular, o Ministério dos Negócios Estrangeiros valoriza muito as comunidades portuguesas e a forma como tem aperfeiçoado o funcionamento da rede consular portuguesa demonstra a vontade de servir da melhor maneira possível a nossa diáspora. A vontade de inovar está a ser bem-sucedida. A título de exemplo, a inovação mais recente é a possibilidade de a entrega do cartão de cidadão ser feita pelo correio. Ao nível da Suíça, a partir do dia 10 de maio, toda e qualquer pessoa que solicite o cartão de cidadão poderá recebê-lo em casa, sem ter de se deslocar uma segunda vez à Seção Consular da Embaixada em Berna ou a qualquer um dos Consulados em Genebra ou em Zurique. Gostaria de dar outros exemplos: No capítulo do ensino superior, o Programa “Estudar e Investigar em Portugal / Study & Research in Portugal” (https://www.study-research.pt) inclui uma plataforma de divulgação das instituições, atividades e projetos relacionados com o ensino superior, a ciência e a tecnologia em Portugal. Este programa oferece condições especiais aos jovens portugueses e lusodescendentes residentes no exterior, nomeadamente o contingente de 7% das vagas de acesso ao ensino superior, que lhes é especialmente destinado; Numa perspetiva económica, a criação do Programa Nacional de Apoio ao Investimento da Diáspora (PNAID: https://portaldascomunidades.mne.gov.pt/pt/gabinete-de-apoio-ao-investidor-da-diaspora-gaid) prevê a criação de linhas de incentivo financeiro direcionadas à captação de investimento e ao apoio a entidades instaladas nos territórios do interior do nosso país. No quadro deste programa, foi atribuída, nas candidaturas ao Aviso Inovação Produtiva para Territórios do Interior (https://www.compete2020.gov.pt/Avisos/detalhe/AAC_08-SI-2020) uma dotação específica de 30% para projetos cujos investidores têm o estatuto de Investidor da Diáspora; O Programa Regressar (https://portaldascomunidades.mne.gov.pt/pt/apoios-as-comunidades/regressar/programa-regressar), que foi prolongado até ao final de 2023, conta com o regresso a Portugal de emigrantes ou seus familiares para fazer face às necessidades de mão-de-obra que hoje se fazem sentir em vários setores da economia portuguesa, reforçando a criação de emprego, o pagamento de contribuições para a segurança social, o investimento e o combate ao envelhecimento demográfico. Para incentivar o regresso e a fixação de emigrantes ou familiares de emigrantes em Portugal, será atribuído um apoio financeiro aos candidatos. Além deste apoio, está prevista a comparticipação em custos de transporte de bens e nos custos de viagem dos destinatários e respetivos membros do agregado familiar, mediante o início de atividade laboral em Portugal continental.
Por fim, quem é Paulo Maia e Silva?
Ingressei na carreira diplomática em finais de 1997. Já estive colocado na Embaixada em Kinshasa, no Consulado em Londres, na qualidade de Cônsul adjunto, nas Embaixadas na Cidade do México, em Pequim e em Díli, antes de ser colocado no Consulado em Zurique.
Ígor Lopes
Fotografias do arquivo
do Gazeta Lusófona