› Lurdes Gonçalves
› Sónia Melo
Realizou-se nos dias 1 e 2 de setembro a quinta edição das Jornadas EPE Suíça, na HEP-BEJUNE em Bienne. A temática Retrospetiva e Linhas de Fuga foi o mote escolhido para refletir sobre o trabalho desenvolvido de 2013 a 2023, assinalando 10 anos de liderança da coordenadora Lurdes Gonçalves.
O corpo docente da CEPE Suíça aderiu ao evento na sua quase totalidade, como tem vindo a ser prática nas edições anteriores. Este décimo aniversário foi honrado com a presença da Exma Senhora Presidente do Camões I.P., Dra Ana Paula Fernandes, que acompanhou os trabalhos durante todo o primeiro dia. A sua presença teve um significado muito especial para todos, sinal de reconhecimento do importante trabalho que os professores da CEPE Suíça têm vindo a desenvolver e desenvolvem junto da comunidade portuguesa neste país.
O Exmo Senhor Embaixador, Júlio Vilela, que, de forma sistemática e assertiva, tem vindo a estimular, apoiar e a dar visibilidade às iniciativas da CEPE Suíça, também esteve presente, bem como o ExmoSenhor Cônsul Geral de Zurique, Gonçalo Motta, sempre disponível para ajudar e contribuir para o sucesso do nosso trabalho.
As Jornadas EPE Suíça iniciaram-se em outubro de 2014 com o objetivo de reunir o corpo docente e partilhar o conhecimento profissional entre todos – um encontro dos professores para os professores. Estes continuam a ser os objetivos que presidem a este encontro científico e profissional. Desde então, é um encontro bienal, garantindo tempo suficiente não só para a preparação do evento seguinte, mas, e sobretudo, garantir tempo para refletir e experimentar as aprendizagens que as trocas profissionais potenciam. Outra característica que se mantém desde o início é a participação ativa dos docentes EPE no encontro, sendo também a responsabilidade científica partilhada desde a IV edição com a Doutora Sónia Melo, membro do corpo docente da CEPE Suíça.
Nesta edição, para a tarefa de reflexão e projeção de um futuro sustentável, socorremo-nos das contribuições não só da responsável máxima da instituição à qual pertencemos, mas também daqueles com quem regularmente colaboramos, sejam as responsáveis pelas cátedras Lídia Jorge, em Genebra e Carlos de Oliveira, em Zurique, sejam membros de associações que trabalham e conhecem o contexto helvético, ou ainda investigadoras e colegas com quem desenvolvemos projetos de formação-ação-investigação e conhecem de perto o trabalho dos professores da CEPE Suíça.
Nesta edição, às conferências, oficinas e trabalhos de grupo, adicionámos momentos de reflexão, discussão e de necessária introspeção, espelhados nas mesas-redondas, nos momentos artísticos e na elaboração conjunta do mural – TransFormAções – cujo objetivo foi gravar impressões, ensinamentos, memórias do corpo docente ao longo da última década.
Como produto da reflexão destes dois dias podemos traçar três linhas de fuga orientadoras do trabalho futuro:
1. a presença do digital
Acompanhar o passo do tempo consubstanciou-se numa quase “naturalização” do investimento do corpo docente na procura de respostas e soluções digitais para o seu trabalho, que facilitam o trabalho colaborativo e a construção de proximidade entre todos, criando redes e sinergias. É na relação que se constrói em torno do envolvimento no trabalho co-construído que alimentamos e impulsionamos a construção do futuro. É importante socorrermo-nos das ferramentas digitais ao nosso dispor, dominá-las e rentabilizá-las para continuar a promover a relação pedagógica com os nossos alunos e profissional com os nossos colegas.
2. a identidade da CEPE Suíça
A CEPE Suíça tem uma identidade própria, cujos contornos conhecemos e são identificados pelos que nos conhecem. Ela é fruto da participação co-construída em vários projetos comuns, decisões tomadas, caminhos escolhidos, geradores de proximidade entre todos. Este sentimento de pertença ao grupo é alimentado e sustentado pelas redes colaborativas criadas e alimentadas, assentes num espaço de comunicação alicerçado na liberdade de expressão, no respeito pelas opiniões de cada um e na responsabilidade individual e coletiva.
3. a configuração de futuro
A organização e qualidade do trabalho da CEPE Suíça são características salientes no panorama do ensino de línguas de herança na Suíça. Prova disso, para além de convites para partilharmos o nosso trabalho, são as várias colaborações em projetos tanto de formação, como de investigação com instituições de ensino superior suíças financiados pela Confederação Helvética.
A articulação do nosso trabalho com o sistema educativo suíço, colocando as línguas de herança no seio do trabalho curricular no domínio “Línguas”, como espaço de valorização e ativação do repertório linguístico de todos os alunos, independentemente das suas pertenças linguísticas é um caminho para a sustentabilidade do EPE.
Assim, fruto do nosso olhar retrospetivo (interno e externo) a nível interno, o futuro inscreve-se na continuidade da aposta no desenvolvimento das competências digitais dos nossos alunos, mas sobretudo no desenvolvimento da compreensão de si próprios enquanto cidadãos de um mundo em contacto permanente, ou seja, de um mundo interconectado no qual o domínio de várias línguas de forma consciente e acional, bem como o conhecimento de várias culturas e a capacidade de estabelecer pontes entre línguas e culturas é não só um fator diferenciador, mas sobretudo conferidor de poder – poder de intervenção, de negociação com o Outro, de escolha e de decisão.
Também constatamos que nestas 5 Jornadas de Formação de professores do EPE Suíça aprendemos a construir o que de mais difícil há: relações assentes na liberdade que têm florescido como rizomas distribuídos em linhas de fuga. Um rizoma constitui, segundo Deleuze e Guattari, um sistema heterogéneo e múltiplo que estabelece conexões várias e multidirecionais. Este conceito representa um modo de entender as relações entre as pessoas e o mundo, o modo como nos conhecemos e como nosconstruímos, partindo de distintas conexões e pontos que se ramificam e geram tantas outras formas possíveis e não uma base uniforme. As dimensões infinitas da liberdade em rizoma tornam clara a riqueza das linhas de fuga identificadas nestas jornadas, trilhos novos e insuspeitados
que traçamos ao ligarmo-nos uns
aos outros. E porque o Outro nos afeta e impele à ação, a linha de fuga é transfiguradora, como o é todo o trabalho docente.
O caminho faz-se caminhando e, lembrando o ensinamento de Séneca, “nenhum vento é favorável se não sabemos o porto de destino”, ou seja, o propósito: promover o ensino e a vivência da língua e cultura portuguesas aos alunos, a CEPE Suíça continuará a encontrar fórmulas motivadoras que alimentem a continuidade da frequência do EPE até ao nível C1 e que dignifiquem o trabalho e empenho dos docentes. Desta forma, esperamos continuar a contribuir para a qualidade do ensino de português língua de herança, apoiando o exercício e desenvolvimento profissional dos docentes e apostando na sua visibilidade e divulgação, enquanto meios para a afirmação internacional da língua e cultura portuguesas.