› Adélio Amaro
› Ígor Lopes
O voto da diáspora portuguesa nas últimas eleições legislativas, que decorreram dia 10 de março, foi decisivo para determinar que futuro político terá Portugal nos próximos anos.
Os votos apurados pelo círculo europeu elegeram deputados do Chega e do Partido Socialista (PS). Foram eleitos por este círculo o estreante José Dias Fernandes (Chega) e Paulo Pisco (PS), que já conta com experiência neste ramo de atuação.
Segundo a Administração Eleitoral de Portugal, o Chega obteve 18,31% dos votos (42.975), seguindo-se o PS, com 38.063 votos (16,22%). A AD conseguiu 33.351 votos, ou seja, 14,21%, e acabou por não eleger o deputado Carlos Gonçalves.
Foram apurados 16 consulados e registados 238.605 votantes, dos 937.311 inscritos. Mais de 1,5 milhões de cartas com os boletins de voto foram enviadas para 189 destinos a partir de 04 de fevereiro e os votos começaram a chegar a Portugal em 20 de fevereiro.
Com este resultado, e com a eleição de José Cesário (AD) e Manuel Magno (Chega) pelo círculo de fora da Europa, Portugal tem já Luís Montenegro como primeiro-ministro. A vitória do pleito ficou com a Aliança Democrática (AD) que conquistou 29,49% votos dos portugueses e 80 deputados na Assembleia da República. O PS foi o segundo partido mais votado e o terceiro o Chega, que quadruplicou o número de deputados. Hoje, a Assembleia da República conta com 80 deputados da AD, 78 do PS, 50 do Chega, 8 da Iniciativa Liberal, 5 do Bloco de Esquerda, 4 da CDU, 4 do Livre e 1 do PAN. Ao todo, estão iniciados 230 mandatos.
Para perceber as linhas de ação e as reações ao resultado das eleições, o Gazeta Lusófona conversou de forma exclusiva com os dois deputados eleitos pelo círculo europeu: José Dias Fernandes (Chega) e Paulo Pisco (PS). Acompanhe as duas entrevistas nesta e na página seguinte.
José Dias Fernandes, deputado do CHEGA
› Ígor Lopes
José Dias Fernandes, de 65 anos, é empresário e está a estrear-se na Assembleia da República de Portugal como deputado, após ser eleito nas últimas eleições legislativas do dia 10 de março, pelo círculo europeu pelo partido Chega.
Ao Gazeta Lusófona, o agora deputado disse avaliar a sua eleição como “resultado de trabalho de muita proximidade junto das nossas comunidades, quer na França, Suíça, Andorra, Alemanha, Luxemburgo, Reino Unido, Bélgica, etc., onde a nossa diáspora já não acredita na comunicação social desta mesma diáspora”.
Sobre a experiência que viveu nas últimas semanas, este responsável destaca o que considera ser uma “campanha que a comunicação social fez contra o Chega e o seu candidato, ignorando-o por completo”. “Desmentimos tudo isso via redes sociais, o que desacreditou por completo a comunicação social e, assim, os emigrantes fizeram o resto. Disseram Chega de manipulação”, frisou.
Durante a sua campanha eleitoral, José Dias Fernandes disse ter “ouvido tudo e a todos e que prestou atenção e esteve atento a todas as revindicações dos emigrantes com que cruzamos, e apuramos que a livre circulação de pessoas e bens, a educação, as lojas de cidadão ou de proximidade e o ensino são prioritárias, assim como o direito de voto para todos os emigrantes”.
Em relação aos votos do seu partido pela emigração na Europa, este deputado é enfático. “O resultado do voto é o resultado de que a diáspora já não acredita mais tanto nos partidos que nos governaram desde há 48 anos, assim como nos deputados que nos representaram durante todos estes anos, pois nada fizeram para o bem das comunidades, absolutamente nada, a não ser receberem ordenado ao fim do mês, deixando degradar todos os serviços consulares, o ensino e etc. E os portugueses acordaram”, comentou José Dias Fernandes, que rejeita rótulos referentes ao viés ideológico das suas ideias.
“Quanto a mim, nunca me senti um radical, muito longe disso, pelo contrário, quem me conhece sabe que sou uma pessoa vertical, muito direito e justo, defendendo sempre os mais necessitados. Nunca me pondo ao lado dos mais poderosos, mas defendendo sempre os mais fracos, por isso, me conhecem os portugueses da diáspora”, defendeu. No país helvético, o partido Chega teve uma votação expressiva, devido, segundo este responsável, às deficientes políticas públicas para as comunidades.
“Na Suíça, os nossos emigrantes foram deixados ao abandono pelo governo socialista, os nossos emigrantes encontraram-se em centenas de casos de dupla tributação e o governo não resolveu o problema, por outro lado, a Suíça é um dos países mais seguros do mundo, onde os nossos emigrantes andam com segurança e estão atentos ao que se passa em Portugal. Não querem que Portugal continue a degradar-se e a se auto destruir com um governo que não governa para Portugal nem para os portugueses e a expressão no voto está certíssima na resposta dada pelos emigrantes na Suíça”.
Sobre os seus próximos passos, José Dias Fernandes disse que vai apostar “no direito de voto para todos os emigrantes que tenham um cartão de cidadão, no ensino, na livre circulação de pessoas e bens, pois, não compreendemos o porquê de não podermos ter em Portugal um veículo automóvel mais de seis meses com matrícula fiscal do país onde residimos, e as lojas de cidadão em cidades onde há maior concentração de portugueses. A minha próxima missão é trabalhar para que o Chega possa ganhar as próximas eleições europeias”.
Em relação à maior participação de votantes nos círculos da emigração, José Dias Fernandes refere que “a diáspora sempre viveu e quis participar na vida política, mas os governos sucessivos não deram aos emigrantes a possibilidade de votar”, indagando que “a comunicação social e algumas associações, que são autênticos mercenários a trabalho dos dois partidos: PS e PSD, controlavam e influenciavam os emigrantes. Nós conseguimos romper esse arco mafioso instalado pelo governo há mais de 40 anos”, questionou.
“O meu contacto com os portugueses na Europa é de muitos anos. As pessoas confiam em mim, pois sabem que sou vertical e que os vou levar politicamente a outro rumo melhor. Daremos muito mais atenção às comunidades portuguesas, pois só o Chega propôs um ministério das Comunidades e isso é uma mais-valia e merecemos. Neste momento, estou a elaborar o plano adequado de ação e ainda não está finalizado”, disse José Dias Fernandes, que refere ter “uma grande experiência no mundo associativo, sendo mesmo fundador de uma associação com o particular interesse de unir os portugueses espalhados pelo mundo e que já existe em vários países”.
“Podem ter a certeza de que tudo farei para que todos os seus direitos constitucionais (diáspora portuguesa) lhes sejam repostos”, finalizou.
Paulo Pisco, deputado
do PS reeleito pela emigração
› Ígor Lopes
O deputado socialista Paulo Pisco, reeleito nas últimas eleições legislativas portuguesas, no dia 10 de março, pela emigração pelo círculo europeu, afirmou estar “orgulhoso” do resultado conquistado nas urnas, apesar de questionar o processo que levou à marcação de um novo pleito eleitoral por Marcelo Rebelo de Sousa.
“Orgulho-me da minha eleição para mais um mandato em circunstâncias tão difíceis, devido à inesperada dissolução da Assembleia da República ditada pelo presidente da República, devido a um processo na justiça que envolveu o primeiro-ministro, sem que as provas contra ele mostrassem consistência. Passados cinco meses, António Costa ainda nem sabe do que é acusado, o que é inaceitável. Mas uma maioria absoluta foi derrubada e hoje o governo é de direita e a extrema-direita subiu de uma forma assustadora”, comentou Pisco.
Segundo este responsável, deve-se, porém, “assinalar o aumento da participação eleitoral” da diáspora portuguesa, “tendo o número de votantes nos dois círculos das comunidades atingido o seu valor mais elevado de sempre, desde a implementação do recenseamento automático em 2017, por um Governo do PS”.
Essa participação mais ativa por parte da diáspora nas eleições passadas significa, de acordo com este deputado, “acima de tudo que, a cada eleição que passa, as comunidades demonstram a sua importância e que as instituições e a sociedade não podem ignorar as aspirações dos portugueses residentes no estrangeiro, porque o voto é uma forma de demonstrar a força da ligação que têm ao país, é uma forma de dizerem que querem que olhemos para as circunstâncias em que se encontram nos países onde estão e que querem que Portugal seja capaz de responder às suas expetativas”.
Ainda no âmbito da última campanha eleitoral, Paulo Pisco recorda experiências, como “o momento da apresentação dos quatro candidatos do PS em Paris pelo secretário Internacional do PS, Francisco André, além do encontro com jovens investigadores na Suíça, a visita à ilha de Jersey, os encontros com criadores em Berlim, os encontros num programa muito intenso nos Altos de França, a dimensão cultural no Luxemburgo e muitos outros momentos em vários países”.
“Ao longo de mês e meio de campanha estive em sete países, 25 cidades e na ilha de Jersey”, enumerou Pisco, que explica quais informações retirou fruto do contacto com as comunidades e que poderão auxiliar nas suas futuras ações.
“As campanhas eleitorais são sempre um momento importante de recolha de informação e de aprendizagem, são uma oportunidade única para nos confrontarmos com os problemas, necessidades e expetativas das comunidades. É também uma oportunidade para estabelecer os primeiros contactos, abordar novos temas e ir ao encontro das comunidades que são mais esquecidas. (…) Serão várias as medidas que pretendo colocar em forma de iniciativa legislativa. Basicamente, algumas das que constituíram as propostas que tínhamos no nosso programa eleitoral”, afirmou.
Experiente no campo político, sobretudo diante das comunidades portuguesas na Europa, Pisco revela que pretende trabalhar para concretizar ações no domínio de temas como “idade de reforma, jovens e mulheres, movimento associativo, várias questões associadas aos automóveis, ensino de português, etc.”.
“na Suíça, a desproporção é tão grande que é preciso ver o que aconteceu”
Este deputado comentou também o crescimento dos votos no partido Chega, inclusive pela emigração.
“Esse é um grande paradoxo, que um partido que é contra os imigrantes e tenha para eles propostas desumanas tenha tido tanto apoio dos portugueses que são imigrantes. É preciso analisar bem o que se passou e perceber se se trata apenas de um voto de protesto potenciado pela retórica manipuladora do Chega sobre corrupção e imigrantes ou se existem outros motivos atendíveis para os quais é preciso dar resposta”, destacou Pisco, que disse ser preciso, inclusive, analisar bem o que aconteceu na Suíça, pois “essa votação é anormal em comparação com o que aconteceu nos outros países”.
“Nas 160 mesas de contagem de votos nos dois primeiros dias relativas a todos os países, o PS ganhou na maioria, em 84 mesas, e o Chega ficou em segundo, ganhando em 54. Em todas houve um equilíbrio de forças entre o PS, AD e Chega. Mas, na Suíça, a desproporção é tão grande que é preciso ver o que aconteceu. Entre algumas das razões apontadas, fala-se da pressão fiscal que os portugueses sentem na Suíça, por causa da troca automática de informações em matéria fiscal, de contas bancárias e de património. Mas é preciso dizer, mais uma vez, que o Governo não tem nada a ver com isso, porque se trata de um acordo no âmbito da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) para combater a lavagem de dinheiro, os tráficos e a corrupção. O Governo não tem aí nenhuma responsabilidade. Mas a desproporção nos votos no Chega em relação aos outros partidos foi tão grande que há toda a legitimidade em querer saber o que realmente se passou, se houve ou não total lisura no processo”, defendeu o deputado reeleito.
Da sua atuação na Assembleia da República de Portugal, Paulo Pisco refere que os portugueses poderão esperar “dedicação total na defesa dos interesses dos nossos compatriotas residentes no estrangeiro”.