Agendado para o dia 22 de maio, a Federação das Associações Portuguesas da Suíça irá apresentar o “1.º Fórum Português da Suíça” que decorrerá durante todo o dia. Da parte da manhã contará com conferência, debates e ateliers participativos com a grande temática: “O que é ser português na Suíça hoje?”.
A tarde será cultural e recreativa e terá música de variedades, Fado, concertinas e intervenção dos cursos de Língua e Cultura Portuguesa. Da parte da manhã é obrigatória inscrição através do e-mail fps.pt.ch@gmail.com ou telefone (+41) 76 425 62 50 e de tarde a entrada é livre. Na última questão da presente entrevista o programa está desenvolvido.
O evento, que tem a colaboração do Gazeta Lusófona e contará com a presença do seu diretor, terá lugar na Sala de Espetáculos de Renens, com início às 9h15 e encerramento por volta das 18 horas.
Para conhecermos mais sobre este projeto e os desafios que pretende desenvolver, fizemos uma entrevista conjunta a Ana Paula Farinha Zehri e Liliana Azevedo.
Ana Paula é presidente da “Entrelaçar”, associação de apoio às pessoas lusófonas na sua integração no Cantão de Vaud, fundada em 1996. Iniciou o trabalho associativo nos anos 80, participando, na altura, na Consulta Social Portuguesa (COSOP), em Lausanne.
Liliana Azevedo faz parte da segunda geração de portugueses na Suíça. Aos 24 anos mudou-se para Lisboa para um estágio de nove meses. Ali permaneceu até hoje… andando sempre cá e lá. Atualmente é bolseira de doutoramento e estuda a transição para a reforma de emigrantes portugueses na Suíça.
Quando nos referimos aos portugueses que residem fora do país, existe uma tendência para os identificar como comunidade portuguesa. Contudo, a mesma comunidade apresenta uma pluralidade que pode variar, por exemplo, devido ao facto de novas gerações terem nascido na Suíça. Acham que falarmos em comunidade portuguesa são os termos certos?
É certo que a população portuguesa na Suíça é hoje bastante mais diversa do que pelo passado. Apesar de ter havido trabalhadores e exilados portugueses já na década de 1960, é somente na década de 1980 que a emigração portuguesa para a Suíça ganha dimensão. A Suíça precisava de mão-de-obra pouco qualificada e o contexto político económico e social português era favorável a que milhares de portugueses com baixa escolaridade preenchessem os postos de trabalho disponíveis na agricultura, na construção e na hotelaria-restauração, principais setores empregadores de trabalhadores sazonais, como eram conhecidos. Com o virar do século e as alterações decorrentes do Acordo de Livre Circulação entre a Suíça e a União Europeia, por um lado, mas também com o desenvolvimento de Portugal em termos de educação e formação, foram chegando à Suíça pessoas com perfis e ambições diferentes. Apesar de uma ampla maioria de portugueses/as que emigraram para a Suíça nos últimos anos continuar a ter apenas a escolaridade obrigatória (que foi alargada ao 12º em 2009!), são cada vez mais aqueles/as que chegam com uma formação profissional ou superior e a dominar o inglês, e por vezes o francês. Assim, em 40 anos, o perfil dos e das emigrantes de primeira-geração foi-se diversificando. Por outro lado, há várias segundas-gerações: pessoas que hoje terão entre 40 e 60 anos, que nasceram em Portugal e vieram para a Suíça em criança, sem papéis; crianças e jovens que nasceram em Portugal e chegaram nos últimos 10-15 anos; crianças, jovens e adultos nascidos na Suíça, muitos dos quais têm dupla nacionalidade. Há também uma terceira geração, alguns já a chegar à idade adulta, que eventualmente nem terão a nacionalidade portuguesa e pouco entendem de português, em particular são fruto de casamentos mistos. O que não quer dizer que não tenham uma ligação afetiva com o país e a família alargada, nomeadamente em época de férias.
Posto isto, o termo “comunidade portuguesa” não é o mais adequado hoje em dia, dada a pouca homogeneidade da população com origens portuguesas. No entanto, poderá usar-se o termo “comunidade” se for tomado no sentido de “interesses comuns”. Mesmo no caso de uma pessoa de terceira geração, nascida numa família multicultural, que não fala a língua nem nunca esteve em Portugal, existe, mais cedo ou mais tarde, uma ligação com Portugal, mesmo que seja apenas a nível administrativo, por várias razões: por exemplo, poder beneficiar de um passaporte europeu, ou uma herança de um parente distante devido ao facto de o povo português ser predominantemente proprietário das suas casas.
Uma última nota sobre este tópico, para salientar que a composição da comissão organizadora do Fórum reflete esta heterogeneidade: é composta por pessoas com perfis muito diversos, que se sentem ligadas a Portugal e à Suíça de distintas formas, mas ao mesmo tempo partilham interesses comuns, bem como dilemas semelhantes em vários aspetos.
Quais são os grandes desafios que os portugueses atravessam nos próximos tempos, cujas dificuldades se agravaram com a Covid-19?
Em todos os países, as pessoas migrantes estão entre as pessoas mais sujeitas à precariedade laboral, económica, habitacional, o que por sua vez tem impactos na sua saúde. A população portuguesa é a terceira população estrangeira mais importante na Suíça e, em termos profissionais, está muito inserida
em setores como a saúde e os serviços de limpeza, além da construção. Esteve, portanto, na linha da frente durante a pandemia.
Uma das questões mais preocupantes em relação ao aumento das dificuldades devidas à Covid-19 é o risco de não poderem renovar a sua autorização de residência. Isto porque, devido ao impacto da Covid-19 no mundo laboral, muitas pessoas precisaram de receber apoio financeiro do Estado. Pessoas com baixos níveis de formação, que trabalhavam na economia informal, por exemplo, a cuidar de pessoas de idade em casas particulares ou de crianças, tiveram de recorrer à assistência social. Uma das possíveis consequências quando se recorre a este tipo de ajuda para as pessoas com uma autorização de residência não permanente (Permis B) poderá ser a recusa do pedido de renovação do Permis; enquanto outras poderão ver o seu pedido de naturalização interrompido devido a se encontrarem a receber apoio do Estado. Em suma, como em todos os países, as pessoas com situações profissionais mais precárias viram as suas dificuldades agravarem-se, entre as quais muitos migrantes portugueses/as.
As situações que refere são, também, uma preocupação para as associações portuguesas na Suíça? Como se pode ajudar esta força associativa que a Covid-19 obrigou a hibernar socialmente?
O associativismo tradicional português começou a sentir várias dificuldades muito antes da pandemia. Algumas associações outras começaram a ter dificuldades em encontrar pessoas para pegar no leme, outras, fecharam mesmo Muitas das pessoas que integravam os corpos dirigentes, e faziam parte das gerações mais velhas, regressaram a Portugal. O rejuvenescimento das estruturas associativas é uma das questões que as fragiliza. Outra é o seu propósito: as associações de migrantes cumprem hoje outras funções, diferentes das que tinham nos anos 1980 e 1990. Porém, nem sempre souberam acompanhar a dinâmica da corrente migratória e são essas que mais foram abaladas pela Covid-19. Ou seja, as associações baseadas no modelo de coletividade cultural e recreativa (os denominados “centros portugueses” por exemplo) tiveram de fechar os seus espaços de convívio e suspender as atividades desportivas, ficando sem os meios financeiros que as sustentam.
Em paralelo a estas associações, mais tradicionais, há um conjunto de associações, algumas bastante recentes, cujo propósito é totalmente diferente e que funcionam em torno de eventos de divulgação, informação, sensibilização em torno de temas ligados à saúde, à violência doméstica, à língua, para referir apenas alguns.
Em todo o caso, as associações portuguesas na Suíça, e noutros países de emigração, precisam do apoio do Estado português. Precisam de um apoio ao seu funcionamento, um apoio financeiro, mas não só. É necessário criar condições favoráveis que potenciam o elo entre Portugal e a sua diáspora. Relativamente ao acesso aos subsídios existentes, as associações de emigrantes e seus descendentes precisam que os procedimentos sejam simplificados, menos burocráticos e mais céleres. As associações portuguesas na Suíça não dispõem de pessoal assalariado, são compostas exclusivamente por pessoas em regime de voluntariado, que não estão habituadas a lidar com os meandros burocráticos nem com a linguagem técnica da administração portuguesa; e sem essas competências torna-se difícil, ou mesmo impossível, obter qualquer apoio de Portugal hoje em dia. Portanto, o primeiro passo seria essa tomada de consciência por parte de quem tem poder para alterar os procedimentos atuais.
Quais são as principais temáticas que vão ser debatidas no Fórum?
O Fórum está organizado em dois momentos distintos. A parte da manhã será reservada ao debate e reflexão em torno da questão “O que é ser português/portuguesa hoje na Suíça?”. Após uma breve conferência da professora Nazaré Torrão que servirá para introduzir o tema, as pessoas presentes serão convidadas a participar em ateliers temáticos. Nestas oficinas, serão debatidas questões em torno de cinco eixos: família; juventude; envelhecimento; cultura; emprego. Espera-se que as pessoas partilhem experiências e preocupações relativamente às suas vivências enquanto migrantes de curta ou longa duração. Espera-se, pois, que o Fórum seja a ocasião para reunir pessoas que se cruzam no espaço público, mas que nem sempre se encontram e discutem. Esta é, sem dúvida, uma boa oportunidade para um encontro inter-geracional, jovens e menos jovens, primeiras e segundas ou terceiras gerações de portugueses.
A parte da tarde será cultural e recreativa. O programa inclui diversas formas de expressão artísticas, da música e canto à dança, à poesia e dramatização, sem esquecer o vídeo. Em cima do palco da Salle de Spectacles de Renens teremos essencialmente jovens de segunda geração. A tarde irá começar com Diana Gil, uma valaisanne que, no ano passado, foi concorrente no The Voice Portugal, ela irá cantar música de variedade, em português mas não só, e será acompanhada à guitarra por Gonçalo Vitorino. Seguir-se-á música portuguesa mais tradicional, com a cantora de fado “vaudoise” Salomé Oliveira, que será acompanhada pela viola e a guitarra de Paco da Silva e Nuno Tomás. A meio da tarde, teremos um espetáculo de dança hip hop, com o grupo Dany da Silva & Black Diamond’s, campeões suíços da modalidade na categoria adultos há sete anos sucessivos e concorrente no Got Talent Portugal em 2017. A tarde irá encerrar com as concertinas do grupo Os Verdadeiros Amigos. Entre estes vários artistas, haverá ainda momentos literários a cargo de jovens dos Cursos de Língua e Cultura Portuguesas da região. Em paralelo, teremos um conjunto de exposições e boa disposição! Ou seja, será uma tarde muito animada.
A quem estiver interessado/a em participar na parte da manhã, pedimos que se inscreva através do formulário online (disponível aqui https://cutt.ly/8SOWQWP ou scaneando o QR code). A inscrição é obrigatória para facilitar a gestão logística inerente ao evento. Quem preferir vir somente da parte da tarde, não necessita de se inscrever, é só aparecer: Rue de Lausanne 37, em Renens.
Adélio Amaro