Numa paisagem deslumbrante à beira do lago Léman situa-se um dos monumentos mais lindos da Suíça, o castelo de Chillon, perto de Montreux. A sua diretora portuguesa, há já quase vinte anos, fez deste local o monumento histórico mais visitado da Suíça. O facto de ter partilhado a sua vida e a sua cultura entre Portugal e a Suíça ajudou-a certamente, com esforço, dedicação e perseverança, a dirigir este “verdadeiro barco de turismo, cultura e encontros entre diferentes povos e línguas”. Estudou história da arte, inglês e contabilidade e parece estar à vontade para dirigir, qual maestro, sendo uma figura de proa no turismo suíço. Este castelo funciona tal qual um relógio suíço de alta precisão e qualidade, devido ao trabalho de uma portuguesa.
Qual é o seu percurso pessoal?
Nasci na Covilhã e vivi em Portugal até aos nove anos. A partir desta idade o meu pai emigrou e fomos viver para França um ano, no fim de 1982. É nessa altura que aprendo a falar francês na escola. A aprendizagem da língua foi rápida. Depois de um ano, regressámos e fomos viver primeiro para Almodôvar, no Alentejo e a seguir para a Covilhã. O meu pai emigrou para vários países, incluindo a Suíça. Em 1987, a minha irmã e eu viemos para a Suíça onde os meus pais e as minhas irmãs mais novas já cá viviam desde 1986.
Frequentou a escola portuguesa na Suíça?
Sim, praticava o português em casa com os meus pais e com as minhas irmãs. Mas, rapidamente entre nós, falávamos francês. Participei num concurso das comunidades portuguesas no âmbito da escola portuguesa, o tema era os descobrimentos e ganhei o primeiro prémio. Sempre mantive o contacto com Portugal.
Já se interessava nessa altura pela cultura?
Vivia no Valais em Monthey e estudei no liceu na secção socioeconómica em Saint-Maurice. Tive que seguir um curso acelerado de alemão, mas, fora isso, não tive qualquer problema de integração na escola. Depois de acabar o liceu, decidi seguir estudos de literatura, história da arte e inglês na Universidade de Lausanne, por interesse próprio e sem saber o que ia exatamente fazer mais tarde. Como eu trabalhava para pagar os meus estudos, aproveitei para cursar alguma coisa que gostasse. Durante o tempo que estudei, trabalhei num restaurante, em vendas numa loja de confecção e como contabilista. Durante este último trabalho decidi completar a minha formação e obtive um diploma de especialista em finanças e contabilidade.
Em 2002 foi criada a fundação que está a gerir o castelo e fui contratada justamente para criar e organizar a sua administração, nomeadamente os recursos humanos e os novos projetos de forma a melhorar as visitas permanentes do castelo. Desde 2004, esta dupla formação ao nível de contabilidade e da cultura favoreceu a minha nomeação ao cargo de diretora do castelo de Chillon.
Qual é a sua função como diretora?
Estou a gerir uma equipa de mais de 50 pessoas. Somos uma PME, por assim dizer. O meu trabalho é comparável à função de maestrina de orquestra que dá o tom e assume a direção geral. Cada parte operacional do castelo tem o seu responsável e ocupo-me da estratégia da fundação, dou as orientações, tenho muitos contactos com instituições culturais, colaboramos continuamente do ponto de vista do turismo, estou também a gerir uma equipa que está sob a minha responsabilidade direta.
Faço também visitas guiadas em francês, inglês e português. Sou responsável por projetos relacionados com exposições temporárias, escrevo os con-teúdos, sou responsável pela parte editorial de uma próxima publicação, por exemplo. Acabei agora o relatório anual de 2020.
Qual foi então o balanço de 2020?
Da mesma forma que em todas as outras atividades ligadas ao turismo, à cultura e aos eventos, sofremos bastante com esta pandemia. Tivemos uma diminuição das visitas de 69% durante o ano 2020. Estivemos fechados quase um terço do ano. Este ano só abrimos no primeiro de abril. Perdemos o público internacional e este castelo vive das visitas dos estrangeiros que representam 75% dos nossos visitantes, e até mais, em alguns anos.
Pode-nos falar da pro-gramação em 2021?
Temos uma programação ligeira esta ano, não vão acontecer grandes eventos, uma programação em conformidade com a COVID-19. Estava prevista uma exposição temporária que foi anulada, este tipo de evento é financiado pela nossa própria receita de bilheteira. Não conseguimos um autofinanciamento para atividades extras.
O que se pode fazer no castelo?
Podemos visitar o castelo em família ou sozinho. Os por-tugueses têm a possibilidade de fazer visitas na sua língua. Há informações disponíveis em português. A entrada para um adulto é de 13.50 CHF. Uma visita guiada é um pouco mais cara. O preço para uma família de dois adultos e cinco crianças é de 35.- CHF, um preço bastante aceitável. Há possibilidade de organizar eventos privados como aniversários. As famílias reservam uma prestação de serviços com direito a uma sala e a um guia. Organizamos também eventos públicos tais como as noites dos museus, peças de teatro e propomos também animações à volta desses eventos. No verão temos visitas guiadas gratuitas em francês e alemão. Três vezes por semana durante o verão organizamos visitas com guias em trajes de época. Pelo preço de 6.- CHF pode alugar um audioguia para ouvir a descrição pormenorizada dos diferentes pontos de interesse do castelo. Existe dois percursos diferentes e adaptados para as crianças de todas as idades. Um percurso lúdico e pedagógico com jogos e para fazerem desenhos.
E as vossas perspetivas são otimistas?
2021 vai ser ainda um ano difícil, mas para o segundo semestre deste ano estamos bastante otimistas. Temos várias propostas de visitantes americanos para setembro. Os americanos constituem o mais importante grupo de visitantes estrangeiros, depois dos chineses. Historicamente os americanos foram sempre fiéis.
Trabalhamos com todas as instituições turísticas da região. O castelo faz parte da atratividade da região Riviera de Montreux e Lavaux.
E pode falar um pouco do interesse histórico deste castelo?
Quando houve escavações, encontraram vestígios romanos. O torreão, a torre de proteção como está, ainda hoje, é do século XI. O castelo está ex-tremamente bem conservado e conta a história da região. Nomeadamente a presença dos condes e dos duques de Sabóia (do século XII até 1536). Trata-se de um lugar estratégico. Foi construído numa ilha rochosa para controlar a passagem entre o norte e o sul da Europa, entre a Lombardia, a França e a Alemanha. Era um eixo importante para os comerciantes e peregrinos ao longo do lago. Tinham de se pagar taxas de passagem. A família de Sabóia construiu outros castelos no século XIII na região em Morges e Yverdon. Os Bernenses conquistaram o castelo em 1536 e ficaram até 1798. O Estado de Vaud tornou-se proprietário do castelo quando foi criado o cantão em 1803. Foi utilizado ao longo dos anos como residência, prisão, armazém, palácio de justiça, arsenal, etc. No final do século XIX, o castelo foi aberto ao público e tem tido, até hoje, um grande sucesso.
O castelo interessou es-critores e pintores?
Jean-Jacques Rousseau escreveu o romance «La Nouvelle Héloïse» e, num dos episódios que descreve a morte da heroína, afogada, situa-se junto do castelo. Os primeiros turistas, como Lord Byron, vieram atrás de Jean-Jacques Rousseau para seguir os passos do romance, à beira do lago, para verem os lugares onde se desenrolava a intriga. Lord Byron escreveu também em 1817 “The Prisoner of Chillon”, poema histórico sobre a prisão do patriota suíço François Bonivard. Os turistas do século XIX eram na sua maioria ingleses e vieram também para seguir os passos de Byron. Essas personalidades do mundo da literatura e da pintura (Rousseau, Victor Hugo, Lord Byron, Turner, Courbet, etc.), durante o século XIX, deram uma aura grandiosa ao castelo que perdurou até aos dias de hoje. Trata-se do monumento mais conhecido na Suíça.
Afinal tem a sorte de trabalhar no local mais lindo da Suíça?
E, em todo o caso, tenho o escritório mais bonito da Suíça, com toda a certeza (risos). Desfruto de uma vista ímpar sobre o lago e as montanhas. Existe uma ligação com Portugal: a infante D. Beatriz de Portugal foi duquesa de Sabóia (1521-1538) e casou-se com o último duque de Sabóia, ainda proprietário do castelo de Chillon.
O que gostaria ainda de salientar?
No ano passado acabámos os trabalhos na zona dos jardins e um novo restaurante “Café Byron” foi aberto. Os portugueses podem vir visitar, comer no restaurante, aproveitar a praia ao lado do castelo, com a possibilidade de fazerem um piquenique. Podem chegar ao castelo a pé, de barco ou de comboio. Os visitantes apre-ciam particularmente o facto de embarcar em Montreux para poderem contemplar o castelo visto do lago, antes da visita. Uma saída ideal dum dia em família ou mesmo sozinho. Um local típico da Suíça e da história de toda uma região e, sobretudo, com muito para descobrir e passear.
Entrevista e fotos: Clément Puippe
Site do castelo de Chillon: www.chillon.ch
Para descobrir alguns vídeos e mais fotografias sobre esta reportagem:
www.gazetalusofona.com