› Ilídio Morgado
Decorreu no dia 2 de novembro em Genebra a apresentação de um estudo com o título “Que des locataires! Participation politique des résidents espagnols et portugais à Genève et Neuchâtel”, que versa sobre a participação na vida política destas comunidades.
Perante uma numerosa plateia, onde prevaleciam, essencialmente, representantes das associações portuguesas e espanholas, e que contou, ainda, com a presença de Leonor Esteves, Cônsul-Geral de Portugal em Genebra, de Natalie de Oliveira, deputada eleita pela emigração pelo círculo europeu, e do Conselheiro de Estado Thierry Apothéloz, grande impulsionador desta iniciativa.
O estudo decorreu entre 2021 e 2023 e pretendia-se entender as razões da fraca participação em atos eleitorais das comunidades ibéricas, debater ideias e recolher propostas a desenvolver junto dessas comunidades. Fatores culturais, históricos, de instrução foram ligeiramente apresentados focando-se em clichés negativos há muito tempo conhecidos e defasados da realidade atribuindo o ónus dessa lacuna à falta de empenho das comunidades migrantes. O tema não é, infelizmente, novo. No que respeita à comunidade portuguesa, nota-se um desinteresse desde há muito tempo, fruto de um passado onde se enraizou que não eramos cidadãos por inteiro numa sociedade que nos acolheu primeiro com reservas de entrada, falo dos anos 1970, 80 e 90, sem direitos fundamentais que foram paulatinamente adotados ao longo dos anos.
Embora possam parecer longínquos, esses anos estão ainda muito perto e as novas gerações seguem os exemplos de desinteresse manifestado até hoje. No que respeita às eleições, em Genebra, o direito de voto aos emigrantes é recente, somente em 2005 se abriu essa porta ao contrário de Neuchatel, onde está consolidado desde 1850, uma disparidade enorme. Este direito só implica votações comunais e não cantonais, que é onde grande parte das decisões de orientação política e executiva se passam. Para completar, pode-se votar, mas não se pode candidatar e ser eleito, incompreensível. Queremos os votos, mas não vos queremos, parece ser a mensagem. Não obstante estas condicionantes, os lusodescendentes têm vindo a integrar a vida política e, nas últimas eleições, candidataram-se cerca de 40. Alguns eleitos e outros com escrutínios interessantes, melhor exemplo Bruno Silva, que presidiu à vila de Thonex, recentemente. Por outro lado, continua a discriminação em relação a competências profissionais, oportunidades escolares e acesso a certas atividades.
Obviamente que Genebra, e a Suíça no seu todo, continuam a ser muito apelativos para se trabalhar, constituir família. É um país de oportunidades. Sentimo-nos bem e, tal como nos dizem amiúde, a comunidade portuguesa é muito valorizada, considerada e reconhecidamente como parte integrante muito importante na vida social e económica. Mas viver em democracia implica que o tratamento seja igual para todos, se existem discrepâncias notórias entre as comunidades e os autóctones é evidente que teremos focos de desinteresse e de afastamento de ambos. Muito há a fazer para aproximar as pessoas dos seus direitos.
O que o estudo mais revelou foi a falta de diálogo e/ou de informação que contribui para esse afastamento, onde as associações podem ter um papel fundamental na criação de pontos referenciais com vista à divulgação de informação pertinente. Temos de ser claros: a comunidade empenha-se e não se esconde, como muito bem disse a Sra. Cônsul, não somos fatalistas nem nos escondemos, mantemos uma intensa atividade cultural ao longo do ano e não nos conhecem porque mantém uma distância incompreensível. À parte raras exceções, como o Sr. Thierry Apothéloz, grande impulsionador desta e de outras iniciativas, um cavaleiro que assume a integração dos migrantes como bandeira, poucos atores políticos e/ou da sociedade civil se juntam a nós ou nos procuram. Já usufruímos muito da vivência entre duas culturas, na partilha das nossas mais profundas raízes, há que dar um impulso para ser ainda mais profunda e profícua. Se estivermos todos atentos, certamente que podemos melhorar muito a ligação entre a comunidade e as autoridades locais e com as outras comunidades, viver, participar. Esperamos que seja o começo de uma “nova era” e que não fique em saco roto.
Fotos: Augusto Lopes