Maria dos Santos nasceu em Lourenço Marques, atual Maputo, em Moçambique, em 1961. Após o 25 de Abril de 1974 foi para Portugal com seus pais, tendo estes regressado ao território natal. Ficaram a viver em Castelo Branco. Em março de 1980 deixou a cidade portuguesa que a recebeu e foi viver para a Suíça, concretamente para Stetten, no cantão de Aargau. Atualmente vive em Lenzburg, entre duas grandes cidades, de um lado Zurique e do outro Basileia.
Trabalha na multinacional Flextronic, uma empresa americana, que se dedica à fabricação de material para análises clínicas. Maria dos Santos é responsável pelo controle de qualidade.
Uma das razões que a levou a deixar Castelo Branco foi a sua inadaptação a Portugal em plena adolescência, desabafando que “foi missão impossível”. Desafiou o seu pai a deixar Portugal, mas ele não cedeu à sua vontade e aos 19 anos fez as malas e partiu para a Suíça.
Assim que chegou à Suíça “soube que o meu destino era este”. O mais complicado foi aprender alemão, mas “quando se é jovem tudo é mais acessível. No início defendia-me em francês”. O seu primeiro contrato de trabalho incluía, uma vez por semana, a escola de alemão e “com a ajuda das colegas de trabalho, que me «obrigavam» a decorar 30 palavras todos os dias, cheguei facilmente à aprendizagem deste complicado idioma. A adaptação foi rapidíssima. Senti-me um peixe a nadar num confortável aquário”, disse Maria dos Santos ao Gazeta Lusófona.
Todavia, é uma apaixonada pela cultura popular portuguesa, “apaixonei-me pela Língua de Camões, quando comecei a fazer rádio, na cidade de Zurique e Aarau. Tinha a responsabilidade de comunicar sem erros. Lia muitos livros em Português, para adquirir o máximo de vocabulário possível e conseguir manter uma conversa com uma linguagem fluida”, referiu.
Através da Rádio Lora, em Zurique, onde tinha a emissão sempre aos sábados, surgiu-lhe o convite para apresentar um festival de folclore. “Foi assim que subi a um palco pela primeira vez, com o Rancho Português de Wetzikon. Nunca mais parei. Para além dos festivais de folclore, apresentei noite de Fados, aniversários de associação entre outras festas”, disse-nos Maria dos Santos, acrescentando que a “etapa mais marcante foi quando o Grupo Desportivo e Cultural Português de Lenzburg me enviou o convite para fundar uma Secção Feminina. Foram dois anos de glória, que guardo com muitas saudades, apesar de não ter sido nada fácil. Foi uma experiência única”, acrescentou.
Também a fascina o jornalismo e a escrita. Começou a colaborar com a imprensa escrita no Gazeta Lusófona “quando foi fundado, sobre o que a nossa comunidade fazia em termos culturais. O Adelino Sá sempre me apoiou e me informou onde poderia ir fazer as reportagens”. Esse caminho levou-a, mais tarde a escrever para a Revista Lusitano de Zurique. Com a Covid o Centro Lusitano Zurique, assim como a maioria das associações, passou por tempos difíceis e com “o avanço das redes sociais e da inteligência artificial, esta associação, para reduzir gastos, pensou em suspender a edição em papel. Recebi a notícia como uma sentença de morte. Foi-me muito difícil, posso mesmo dizer impossível imaginar o Centro Lusitano sem a Revista. Lancei o alerta e em parceria com o Pedro Nogueira agarramos o projeto. Temos o Manuel Araújo em Portugal que tem sido o nosso talismã. Nunca terei palavras que cheguem para lhe agradecer o muito que estou a aprender em termos jornalísticos. Está a ser uma experiência incrível a todos os níveis”, desabafou Maria dos Santos que acabou por assumir a responsabilidade editorial da citada Revista.
Quando se fala de Portugal apenas refere que tem saudade das poucas pessoas que lá deixou, porque “estive lá muito pouco tempo e não criei raízes”, esclarece. Por isso, sente a falta das “amizades, nomeadamente aquelas que guardo no coração. Vou três, quatro vezes por ano a Portugal e sempre me encontro com as poucas amizades que cimentei. Depois está a componente familiar que faz toda a diferença”, sublinhou.
No entanto, quando questionada sobre as grandes diferenças entre Portugal e Suíça, responde categoricamente que estas “são notórias. Em Portugal os principais pilares que estabilizam um país não funcionam e os que funcionam demoram meses. O ensino está um caos, o Sistema Nacional de Saúde, com falta de médicos, enfermeiros e auxiliares, é uma aberração, o apoio aos idosos com lares é outro ponto fraco, entre muitos outros. A política e respetiva corrupção é uma vergonha. Na Suíça, apesar de agora já se notar algumas deficiências, tudo funciona e continuamos a resolver a maioria dos problemas com um telefonema, sem ter de esperar meses. Não estou a dizer que não temos corrupção, ela existe em todos os países, aqui quiçá menos. Destes 42 anos aqui vividos, não tenho absolutamente nada a dizer; será que sempre tive sorte? Se foi um anjinho da guarda que sempre me protegeu, posso considerar-me uma sortuda. Fui e sou feliz na Confederação Helvética. Aqui consegui realizar todos os projetos que idealizei. Não teria sido a mesma mulher se não tivesse vivido todas essas experiências neste magnífico país do chocolate, queijo e canivetes”, afirmou Maria dos Santos.
Todavia, mesmo assim, pensa em regressar a Portugal e diz que voltaria a escolher a Suíça para viver e trabalhar e “percorreria a mesma avenida da vida, sem suprimir absolutamente nada”.
Maria dos Santos tem visitado imensas regiões helvéticas, principalmente montanhas. Tem esse gosto em conhecer a natureza helvética, esclarecendo que a “natureza sempre foi o meu porto de abrigo. É nela que vou buscar energia. Adoro o silêncio de uma montanha ou de um bosque. O cheiro, as paisagens idílicas fascinam-me e explorar o desconhecido atrai-me. Conheço a Suíça de norte a sul, leste e oeste”, disse-nos.
Tem como objetivos a curto prazo “manter-me saudável, sou muito disciplinada com o desporto e alimentação. A nível profissional, quero chegar ao meu último dia de trabalho motivada e com boas energias, para receber a reforma de braços abertos e com muita vontade de começar a realizar os projetos que tenho já traçados”, afirmou orgulhosamente.
Culturalmente “gostaria de dar continuidade a todos os rascunhos que tenho na gaveta” e continuar “a marcar presença para onde for convidada. É sempre gratificante sentir o carinho, amizade e respeito que toda a Comunidade tem por mim e que estarei eternamente grata. Tenho vivido momentos que levarei para a eternidade”, esclareceu Maria dosa Santos que não deixou passar a oportunidade para agradecer a todas as associações portuguesas, “comissão de pais e ranchos folclóricos”, sem eles “a minha vida não teria sido tão enriquecedora e colorida”.
Adélio Amaro