Carlos Gonçalves, ex-deputado eleito pelo círculo europeu pelo Partido Social Democrata (PSD), é agora Secretário Executivo do Secretariado Nacional deste partido para as Comunidades Portuguesas.
Em entrevista à nossa reportagem, Carlos Gonçalves reiterou a importância da diáspora portuguesa, os desafios que tem pela frente para estabilizar o PSD neste raio de ação e o papel dos portugueses emigrados na Europa, sobretudo na Suíça.
Como será o trabalho que pretende desenvolver na condição de Secretário Executivo do Secretariado Nacional do PSD para as Comunidades Portuguesas?
Para mim é uma honra, mas, também, um enorme desafio voltar a assumir funções no PSD na área das Comunidades Portuguesas. Uma honra, pois entendo que esta área da governação é fundamental para o país e para a sua afirmação externa e também um desafio, pois o PSD deve ter como objetivo reconquistar a confiança dos portugueses residentes no estrangeiro. O trabalho que irei procurar desenvolver em colaboração com o Coordenador José Cesário, com os diferentes órgãos nacionais do PSD e com as estruturas da emigração, terá como propósito reorganizar o Partido na área das Comunidades Portuguesas e trabalhar em propostas políticas dirigidas a um sector que considero essencial para o país e que devemos valorizar.
Como será voltar a trabalhar politicamente com José Cesário, que é hoje o Coordenador do Secretariado Nacional do PSD para as Comunidades Portuguesas?
Há muitos anos que trabalho e colaboro com o José Cesário na área das Comunidades Portuguesas. O convite que agora me dirigiu para assumir as funções de Secretário Executivo é desafiante, pois o Partido, tal como em 1999, perdeu uma importate base de apoio nos círculos da emigração que agora devemos tentar reconquistar. Esta perda de influência leva a que hoje apenas tenhamos um deputado eleito pelos círculos da emigração. O José Cesário é um político experiente, conhecedor profundo da realidade da emigração e, tal como demonstrou no exercício de funções governativas, é alguém com capacidade reformadora que tanto é necessária num país como Portugal, nomeadamente numa área de governação tantas vezes esquecida. Na minha opinião, o presidente do PSD, Luís Montenegro, e a sua Comissão Política tomaram uma excelente decisão ao nomear José Cesário para Coordenador do Secretariado Nacional para as Comunidades Portuguesas. A reação dos militantes e das próprias comunidades a esta escolha tem sido muito positiva, pois ela é um sinal de esperança para os portugueses residentes no estrangeiro que, infelizmente, se sentem cada vez mais entregues a si próprios.
Como a sua larga experiência como deputado eleito pelo círculo europeu pode ajudar na tomada de decisões e no auxílio dos caminhos a seguir?
As políticas dirigidas às comunidades portuguesas têm sempre que ter em conta as diversas especificidades de cada comunidade. O meu conhecimento da realidade que vivem os portugueses residentes em países do espaço Europeu pode ajudar nas tomadas de decisão do PSD no que concerne a área das Comunidades Portuguesas. O meu conhecimento desta realidade tem a ver com as funções políticas que exerci, mas, sobretudo, pela vivência pessoal que tenho dessa realidade, pois vivo na região de Paris desde 1982. Se a política tem como melhor definição a de resolver os problemas das pessoas parece-me importante que aqueles que trabalham e estudam esta área da governação tenham noção da realidade vivida pelos portugueses que residem no estrangeiro. Pensar as Comunidades exclusivamente a partir de Lisboa não me parece que seja a melhor de forma de encontrar as respostas adequadas aos problemas dos nacionais que residem fora do país.
Por quantos anos foi deputado pela Europa?
Eu fui eleito pela primeira vez em 2002. Mais tarde, deixei a Assembleia da República no momento em que assumi funções como Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas regressando novamente ao Parlamento em 2005. Como é do conhecimento público, cessei funções como Deputado à Assembleia da República em março passado. Foi um enorme privilégio ter merecido em várias eleições a confiança das gentes da emigração. Foi uma enorme honra representar esse Portugal espalhado pelo mundo na Assembleia da República.
Como avalia hoje o estado das comunidades portuguesas espalhadas pela Europa?
As nossas comunidades a residir no espaço europeu têm uma relação muito intensa com o nosso país, abrindo, assim, uma enorme janela de oportunidades para Portugal, saiba ele aproveitar o seu potencial em prol do país. Apesar de haver algumas diferenças entre países, o nível de integração nas sociedades de acolhimento é positivo e as nossas comunidades têm vindo a adquirir nesses países um peso económico, social e político que a todos nos deve orgulhar. Na maioria dos casos, as nossas principais comunidades vivem em países da União Europeia, exceção feita à Suíça e, desde o ano transato, ao Reino Unido. Convém referir que o Brexit teve grandes repercussões significativas na vida da nossa comunidade e algumas das consequências da saída do Reino Unido da UE para os portugueses que ali residem ainda não são totalmente tangíveis. Por tudo isto, considero que esta é a comunidade à qual se deve, neste momento, dedicar maior atenção. Apesar da situação ser, no plano geral, positiva, não podemos ignorar que, em alguns países, a nossa comunidade conhece alguns prolemas de âmbito social com consequências no seu processo de afirmação e integração no país de residência. Quando se fala de emigração é sempre referido que temos tido nos últimos anos uma nova emigração composta por jovens portugueses, sem emprego ou sem perspetivas de evolução profissional, com necessidade de novos desafios ou com salários baixos, que se decidem por sair do país. Infelizmente, apesar de uma boa parte destes jovens ser detentor de um diploma do ensino superior e a maioria ser qualificada nem sempre conseguem empregos no estrangeiro ao nível da qualificação que possuem. Temos hoje, no seio das comunidades portuguesas residentes na Europa, uma situação mais heterogénea que merece novas e especificas respostas. Fala-se muito dos casos de sucesso, mas a emigração não é propriamente um mundo de facilidades.
Quais são hoje, na sua opinião, as grandes dificuldades enfrentadas pelas comunidades portuguesas residentes na Europa?
Na maioria dos países de acolhimento, as dificuldades que enfrentam os portugueses são idênticas aos nacionais desses países. No entanto, as nossas comunidades conhecem vários problemas, nomeadamente no plano social. No entanto, estamos a falar de um espaço em que a maioria dos países têm respostas para atender às questões de maior dificuldade. Quanto à sua relação com Portugal, as principais dificuldades prendem-se com o atendimento consular que conhece uma situação sem paralelo na história democrática do país e da oferta de ensino da Língua Portuguesa tema que desapareceu do debate político na área das comunidades portuguesas. A questão da rotura que conhecem na rede consular é um problema de enorme gravidade. A insuficiência dos serviços consulares compromete a relação destes portugueses com o seu país, o que tem consequências a variadíssimos níveis. Muitos têm sido os anúncios feitos pelo Governo sobre a situação da rede consular, mas, na prática, apesar dos esforços dos funcionários, a situação é critica e, em alguns países, os nossos cidadãos esperam e desesperam para serem atendidos no Consulado de Portugal da sua residência. Depois, há outras questões de enorme importância, como a participação cívica e política, os jovens, o movimento associativo que vive uma situação no pós-pandemia muito difícil e ao qual devemos dar a maior atenção ou o mundo das empresas das comunidades e o consequente investimento no nosso país e nos nossos territórios.
Tem dados sobre a comunidade portuguesa na Suíça?
Segundo o “Office Federal des Statistiques”, o número de portugueses a residir na Suíça em 2020 era de cerca de 257 mil pessoas. É, em termos de população, a terceira maior comunidade a residir num país europeu logo a seguir à França e ao Reino Unido. No entanto, nos últimos anos, verificou-se um abrandamento da emigração portuguesa para a Suíça, o que, considerando o habitual movimento de regresso, justifica a diminuição da população portuguesa na Confederação Helvética. Este estatuto de terceiro país em termos de comunidade portuguesa que se verifica no plano demográfico e no plano eleitoral é superado no que se refere às remessas onde a Suíça ultrapassou a França em 2021 sendo, agora, o principal país de emigração portuguesa no mundo no envio de remessas para Portugal.
Hoje, as comunidades portuguesas residentes na Europa contam com dois deputados eleitos do PS. Como o PSD pode atuar junto das comunidades residentes na Europa diante deste cenário?
Desde logo através da sua organização e dos seus militantes que connosco irão colaborar. Será também necessário auscultar as comunidades tentando, dentro do possível, privilegiar um trabalho de proximidade e de contacto com as suas forças vivas. É importante ouvir o movimento associativo, os luso-eleitos, os Conselheiros das Comunidades Portuguesas, os empresários, os agentes culturais, os professores, responsáveis das autoridades locais… Será um trabalho diferente daquele que, no meu entender, deve ser produzido por um Deputado, mas, para avançar com propostas, é absolutamente necessário esse trabalho para e com as comunidades. Os portugueses a residir no Círculo Eleitoral da Europa poderão contar connosco neste importante trabalho em prol da defesa dos interesses das comunidades portuguesas e, através delas, de Portugal.
Que outras funções ocupa hoje?
Para além das funções profissionais que exerço no Consulado-Geral de Portugal em Paris, sou membro da Assembleia Municipal de Vila Velha de Ródão, sou conselheiro Nacional do PSD e presidente da Mesa do PSD Paris.
O que podem esperar do seu trabalho os portugueses e lusodescendentes residentes na Suíça?
Que, tal como referi anteriormente, a nossa comunidade residente na Suíça pode continuar a contar comigo e com o PSD. Lembro-me que muito jovem, e apenas como dirigente do PSD Paris, estive envolvido na luta em defesa da participação dos portugueses residentes no estrangeiro nas eleições para o presidente da República. Hoje, muitos dos leitores do Gazeta Lusófona poderão já não estar lembrados, mas esta foi uma das grandes reivindicações dos portugueses residentes no estrangeiro durante mais de duas décadas, pois esse direito só veio a se concretizar em 1997. Ou seja, 23 anos depois do 25 de Abril. Este é um bom exemplo de que há política e iniciativa política muito para além do exercício de funções de Deputado.
Que políticas devem ser aprimoradas para as comunidades neste país helvético?
Desde logo, uma melhor resposta dos nossos serviços consulares, um alargamento da oferta do ensino da língua portuguesa e um apoio claro ao nosso movimento associativo. Penso que, tal como nos outros países, é necessário, no plano bilateral, dado que a Suíça não é membro da União Europeia, estar atento às questões relativas à nossa comunidade, nomeadamente, de âmbito social ou no que se refere ao ensino da língua portuguesa. Devemos também sensibilizar a nossa comunidade para a participação cívica e política tanto em Portugal como na Suíça. Temos já bons exemplos de luso-eleitos na Suíça, mas é necessário ir mais longe, pois, como diz o povo, quem não vota não conta.
Que ações serão levadas a cabo de imediato e o que espera para o futuro?
Num primeiro momento, vamos ter que reunir e trabalhar com as estruturas do PSD na Europa e efetuar diversos contactos com as comunidades incluindo, a Suíça. Temos muito trabalho pela frente, mas é um excelente desafio.
Ígor Lopes