Adélio Amaro
A Federação das Associações Portuguesas da Suíça está a promover o “1.º Fórum Português na Suíça”. O evento está agendado para o dia 22 de maio, a realizar na Salle de Spectacles de Renens, e terá como mote “O que é ser português/portuguesa na Suíça de hoje?”.
O Gazeta Lusófona, que marcará presença nesta iniciativa refletiva sobre a situação dos portugueses na Suíça, entrevistou três dos elementos da comissão organizadora para entender os objetivos delineados para este encontro que pretende ser um contributo para os portugueses a viver no país helvético.
Assim, o Gazeta Lusófona entrevistou, com respostas conjuntas: Ana Caldeira Tognola, residente em Fribourg, Diretora da Biblioteca Intercultural, LivrEchange, vive na Suíça há 48 anos; António Cunha, reside em Renens, aposentado e vive na Suíça há 50 anos e Filomena Rodrigues, a viver em Bussigny, Secretária de Contabilidade e está na Suíça há 40 anos.
Quando foi formada e no que consiste a Federação das Associações Portuguesas da Suíça (FAPS)?
A FAPS foi fundada em 2001 em substituição da Federação de Associações Portuguesas fundada a 10 de fevereiro de 1989. A FAPS definiu-se inicialmente como um organismo de cúpula agregando as associações portuguesas que foram nascendo por toda o país durante as várias vagas de emigração dos anos 1970 e 1980. Era inicialmente uma estrutura descentralizada com representantes em diversos cantões principalmente na Suíça Romanda. A ideia básica consistia em unir vontades em defesa dos direitos dos emigrantes radicados na Suíça. Tratava-se em primeiro lugar de favorecer a troca de informações e contatos entre as associações, estreitar laços de amizade e apoiá-las junto das autoridades suíças e portuguesas ; coordenar a organização de atividades de interesse comum no respeito da diversidade e da identidade de cada associação. A FAPS teve um papel importante de revindicação de melhores serviços consulares, de descentralização dos mesmos em permanências consulares e na implantação do ensino de língua e cultura portuguesa. Numa segunda fase a FAPS dedicou o essencial dos seus recursos à divulgação da cultura portuguesa (literatura, poesia, música, cinema, etc.) e à representação da comunidade nos dispositivos institucionais suíços relativos à facilitação dos processos de integração (Commission fédérale pour l’intégration des migrants, Chambres consultatives cantonales, etc.)
Tem sido fácil fazer, de certa forma, o papel moderador das associações na Suíça?
O papel da FAPS ao longo dos 30 anos de existência foi mais de mediação social e cultural do que propriamente de moderação. Mediação entre os portugueses residentes na Suíça e o estado português e mediação entre a comunidade portuguesa e as organizações suíças. A maior parte dos responsáveis da FAPS sempre estiveram empenhados nas Comissões de integração a nível federal, cantonal e municipal onde se discutia a definição das politicas públicas em matéria de direitos dos migrantes. Esse combate foi sempre pacífico embora nem sempre com os resultados desejados. Já as relações com os representantes do Estado português tiveram momentos mais tensos essencialmente ditados pela pouca reatividade do sistema político-administrativo português às exigências da Comunidade nos diversos campos: agilização e acessibilidade aos serviços consulares, ensino da língua e cultura portuguesa, representação política, acesso efetivo ao direito de voto, apoios às associações, etc.
Durante estes mais de 30 anos a FAPS tem encontrado dificuldades em passar a sua mensagem?
As dificuldades atuais da FAPS não nos parecem situar-se nessa vertente. São mais profundas. Se pensarmos os trinta anos de atividade teremos que distinguir duas fases principais. A primeira é uma fase de crescimento com dois ciclos distintos um de índole reivindicativa, de luta pelos direitos dos migrantes que culmina com a fundação do «Forum pour l’Intégration des Migrants et des Migrantes» (FIMM) em 2000. A FAPS reunia então cerca de 60 associações incluindo as Comissões de Pais das escolas portuguesa. O FIMM, no qual a FAPS assumiu a presidência até 2007 reunia 700 associações representativas de 20 nacionalidades. A segunda fase (2005-2022) foi mais voltada para a construção de processos de intervenção cultural junto da comunidade portuguesa. Nos últimos dez anos desta segunda fase a FAPS entrou manifestamente num ciclo de declínio por diversos motivos: o desgaste dos apoios políticos com que pode contar durante o seu crescimento inicial; a dificuldade em renovar os quadros dirigentes; uma falta endémica de apoios financeiros por parte do estado português; mas sobretudo o declínio do próprio movimento associativo português. É este conjunto de fatores que torna hoje o projeto insustentável.
Que papel têm desempenhado e que importância têm as associações portuguesas na Suíça?
O papel das associações tem sido de grande relevância para a comunidade portuguesa. As associações fazem parte da história da emigração. Elas têm sido na Suíça como noutros países um ponto de encontro e de convívio e um dos principais veículos da ligação afetiva ao nosso país. Elas ofereceram, sobretudo nas fases iniciais da instalação dos fluxos migratórios, um espaço de acolhimento comum em que as relações em público se podiam libertar das normas sociais da sociedade suíça. Ali podia-se falar mais alto, pôr as crianças a circular livremente, ver e ouvir a televisão portuguesa, comentando-se os jornais e as atualidades desportivas, jogando à sueca, ouvindo uns fadinhos, etc. Ir às associações foi e continua a ser visitar simbolicamente um certo Portugal graças a um quadro de referências comuns. As associações jogaram também um papel importante de informação e de entreajuda, facilitador de inclusão social, de organização de atividades recreativas, etc. Em suma as associações têm sido ao longo dos anos polos de referência da sociabilidade e espaços de reprodução de referências culturais. Têm sido também espaços de informação, de entreajuda e de afirmação cívica reunindo todas as qualidades e todos os defeitos das nossas próprias vivências.
Sabemos que neste momento a FAPS está a reunir esforços com o intuito de organizar o “1.º Fórum Português na Suíça”. Qual é o objetivo do referido Fórum?
O presente Fórum surge da constatação de que tanto a população portuguesa como o associativismo português na Suíça se alteraram e diversificaram ao longo das últimas décadas. Verifica-se que o modelo da Federação das Associações Portuguesas de Suíça (FAPS), como estrutura formal criada em finais dos anos 1980 para facilitar a coordenação entre as associações existentes em diferentes pontos do país, bem como para agilizar a interlocução com diversas instituições da sociedade suíça, se encontra esgotado no contexto atual. O funcionamento de uma estrutura de articulação precisa, portanto, de ser repensado. Para tal, importa criar condições para um debate alargado que reúna um conjunto diversificado de pessoas e organizações das comunidades portuguesas na Suíça, no qual possam ser abordados desafios atuais e perspetivas futuras. Assim, este Iº Fórum Português na Suíça pretende ser:
– um espaço de encontro e diálogo onde se possam debater as questões relativas à relação entre os emigrantes a sociedade de acolhimento e o Estado português face a um processo de integração que parece ser cada vez mais absorvente;
– uma rede de competências diversas que possam assegurar a função de centro de recursos, nomeadamente quando pessoas, instituições ou meios de comunicação procuram um/a interlocutor/a de origem portuguesa;
– uma estrutura de coordenação, informal e ágil, aberta à diversidade de opinião, que desempenhe o papel de elo de ligação entre diferentes atores da comunidade portuguesa, mas que permita também capitalizar a disponibilidade de cada um.
Já têm tema, data, local e contato previstos?
Propõe-se que o mote para esta primeira edição do Fórum seja “O que é ser português/portuguesa na Suíça hoje?” A reflexão é iniciada pela manhã por uma Conferência da Professora Nazaré Torrão e organizada à volta de vários painéis participativos. A tarde será lúdica e recreativa. A Embaixada de Portugal em Berna e o Consulado de Portugal em Genebra já manifestaram o seu interesse e apoio à iniciativa. O Fórum realizar-se-á na Salle de Spectacles de Renens, no domingo dia 22 de maio 2022. A entrada é livre mas as inscrições na parte matinal (conferência/ateliers-debate) e almoço volante é obrigatória. Para isso basta escrever “quero participar” e deixar o nome e contacto enviando para o endereço: fps.pt.ch@gmail.com .Entraremos em contacto com as pessoas interessadas.
Será criada alguma comissão ou grupo de trabalho? Constituída por quem?
Um “grupo de trabalho” cuja maior parte das pessoas, por razões práticas reside na região de Lausanne foi criado. É constituído por : Alexandre Gouveia, Ana Caldeira Tognola, Ana Paula Farinha, António Cunha, Filomena Rodriques, Flávio Borda D’Agua, João Guedes, Lídia Saraiva, Liliana Azevedo, Marta Pinto, Sílvia Sá.
Este será um Fórum de união na procura de soluções para os problemas que os portugueses encontram na Suíça, tanto a nível pessoal como associativo?
Será certamente um Fórum festivo, de reflexão serena e convivial sobre as nossas maneiras de pensar e viver o vínculo à cultura portuguesa. Será um Fórum sobre a maneira como nos sentimos, ou não, incluídos na sociedade suíça, um espaço aberto à diversidade de opiniões, aberto também ao diálogo intergeracional sendo que cada um poder-se-á exprimir na língua na qual se sinta mais à vontade, em português ou em francês. Será um Fórum a partir do qual talvez possamos desenhar coletivamente um novo rosto da(s) comunidade(s) portuguesa(s) na Suíça a partir da resposta que soubermos dar à questão colocada : “O que é ser português/portuguesa na Suíça hoje?”
De que forma o emigrante português tem relevo perante a comunidade suíça?
A partir dos anos 1980, a Suíça passou a ser um dos principais destinos dos emigrantes portugueses, sendo hoje o segundo país da Europa com maior número de compatriotas. Com a entrada em vigor, em 2002, do acordo de livre circulação entre a Suíça e a União Europeia, o estatuto de residente dos portugueses melhorou e o perfil sociodemográfico transformou-se sendo que as últimas vagas de migrantes são de maneira geral mais qualificadas e muitos têm uma origem urbana. A nova emigração conhece melhor os seus direitos e é mais exigente. Todavia, a imagem do emigrante português, trabalhador, discreto, pouco dado a revindicações e sabendo ficar no seu lugar, quase invisível no espaço público persiste para além da transformação daquilo que parece “ser português hoje na Suíça”. Por outro lado, para muitos portugueses que cruzamos no nosso quotidiano, integrar-se na sociedade consiste antes de mais em ser pontual e trabalhar seriamente. Valores helvéticos que fazem com que a comunidade seja apreciada.
A integração, ao longo dos anos tem sido fácil para os portugueses?
Vamos tentar dar alguns elementos de resposta a esta pergunta no dia 22 de maio em Renens? Venha dar o seu contributo e traga outro amigo ou amiga também.